Figuras híbridas (cruzamento ou mistura de espécies diferentes) ou
intermediárias são as que se situam entre o direito pessoal e o direito real. Alguns juristas preferem a expressão obrigação mista. São elas: obrigações propter rem, os ônus reais e as obrigações com eficácia real.
1.1. Obrigações “propter rem”:
• Conceito: é a que recai sobre uma pessoa, por força de um direito
real. Só existe em razão da situação jurídica do obrigado, de titular do domínio ou de detentor de determinada coisa. (Ex.: obrigação imposta aos proprietários e inquilinos de um prédio de não prejudicarem a segurança, o sossego e a saúde dos vizinhos – art. 1277 do CC; obrigação de indenizar benfeitorias – art. 1.219 do CC; obrigação imposta ao condômino de concorrer para as despesas de conservação da coisa comum – art.1315, etc.).
LEMBRE-SE: a prestação é imposta em função da titularidade
da coisa. Portanto, uma vez substituído o titular passivo, ao adquirente recai o dever de prestar o que se encontra ligado à coisa.
Essa substituição só vigora enquanto a obrigação real,
continuando ligada a determinada coisa, não ganhar autonomia. Ex.: terceiro que recebe imóvel do proprietário anterior com obra em contravenção do direito da vizinhança, não irá reparar os danos causados, mas estará impedido de fazer obra dessa espécie.
• Caracteriza-se pela origem e transmissibilidade automática. O
adquirente do direito real não pode recusar-se em assumi-la.
• É importante ressaltar, também, que o caráter de tipicidade da
obrigação propter rem decorrente da sua acessoriedade como direito real. Diferente das servidões em que a lei permite a sua criação pela convenção dos respectivos titulares do domínio.
• Natureza jurídica: a doutrina moderna entende que a obrigação
propter rem situa-se no terreno fronteiriço entre os direitos reais e os pessoais (obrigacionais). Direito misto – tem características de direito real por recair sobre uma pessoa que fica adstrita a satisfazer uma prestação, e de direito real, pois vincula sempre o titular da coisa.
1.2. Ônus reais
• Conceito: são obrigações que limitam o uso e gozo da propriedade,
constituindo gravames ou direitos oponíveis erga omines. O titular só poderá exercer o direito se suportar o ônus (Ex.: servidão – art.1382; renda constituída sobre os imóveis – art. 803 e 813. Este instituto está em desuso – o proprietário do imóvel obrigava-se a pagar prestações periódicas de sua soma determinada. Art. 754 do CC de 1916)
• Aderem e acompanham a coisa. Quem deve é esta e não a pessoa.
• O titular da coisa deve ser devedor, sujeito passivo de uma obrigação.
1.3. Obrigações com eficácia real
• Conceito: são as que, sem perder seu caráter de direito a uma
prestação, transmitem-se e são oponíveis a terceiro que adquira direito sobre determinado bem.
• Certas obrigações resultantes de contratos alcançam, por força de lei,
a dimensão de direito real.
• Ex.: art. 27 da Lei Inquilinária (Lei 8.245/91):
“Art. 27. No caso de venda, promessa de venda, cessão ou
promessa de cessão de direitos ou dação em pagamento, o locatário tem preferência para adquirir o imóvel locado, em igualdade de condições com terceiros, devendo o locador dar-lhe conhecimento do negócio mediante notificação judicial, extrajudicial ou outro meio de ciência inequívoca.
Parágrafo único. A comunicação deverá conter todas as
condições do negócio e, em especial, o preço, a forma de pagamento, a existência de ônus reais, bem como o local e horário em que pode ser examinada a documentação pertinente.”
Existirá um direito real para o inquilino se tiver registrado
devidamente o contrato, o qual lhe permitirá haver o imóvel, ou então, exclusivamente, um direito pessoal estampado em um pedido de perdas e danos. O contrato de locação, com registro imobiliário, permite que o locatário oponha seu direito de preferência erga omnes (contra todos).
• Situação semelhante é a do compromisso de compra e venda, em
que, uma vez inscrito no Registro Imobiliário, o compromissário passará a gozar de direito real, oponível a terceiros.
2. Modalidades das obrigações
Modalidade é o mesmo que espécies. Não há uniformidade de
critério entre os autores, variando a classificação conforme o enfoque e a metodologia adotada.
• Quanto ao objeto: dar, fazer (obrigações positivas) e não fazer
(obrigação negativa). Há casos em que a obrigação de fazer pode abranger a obrigação de dar. Ex.: contrato de empreitada com fornecimento de material.
• Quanto aos seus elementos: dividem-se as obrigações em:
todos os elementos no singular. Ex.: João obrigou-se a entregar a José um veículo.
*Composta ou complexa: quando um dos elementos acima
estiver no plural, a obrigação será composta. Ex.: João obrigou-se a entregar a José um veículo e um animal (dois objetos). A) No exemplo acima será obrigação composta por multiplicidade de objetos. Esta, por sua vez, pode ser dividida em:
A.1) cumulativas ou conjuntivas: os objetos
encontram-se ligados pela conjunção “e”, ex.: obrigação de entregar um veículo “e” um animal;
A.2) alternativas ou disjuntivas: estão ligados
pela disjuntiva “ou”, ex.: entregar um veículo “ou” um animal. Nesse caso o devedor libera-se da obrigação entregando o veículo ou o animal.
Alguns doutrinadores mencionam uma espécie
“sui generis” da modalidade alternativa, a facultativa: trata de obrigação simples ficando porém ao devedor, e só a ele, exonerar-se mediante o cumprimento de prestação diversa da pretendida – obrigação com faculdade de substituição. Neste caso ela é vista só sob a ótica do devedor, pois se observarmos sob o prisma do credor ela será simples.
B) Por outro lado, caso haja mais de um sujeito
seja ele ativo ou passivo, será obrigação composta por multiplicidade de sujeitos. Estas, por sua vez, podem ser:
B.1) divisíveis: o objeto da prestação pode ser
dividido entre os sujeitos – cada credor só tem o direito à sua parte, podendo reclamá-la independentemente do outro. E cada devedor responde exclusivamente pela sua quota. Se houver duas prestações o credor pode exigi-la dos dois devedores (CC art. 257);
B.2) indivisíveis: o objeto da prestação não pode
ser dividido entre os sujeitos (CC, art. 258). Lembrando que neste caso, cada devedor é responsável por sua quota parte, todavia, em função da indivisibilidade física do objeto (ex.: cavalo) a prestação deve ser cumprida por inteiro (art. 259 e 261);
B.3) solidárias: independe da divisibilidade ou da
indivisibilidade, pois resulta da lei ou da vontade das partes (CC art. 265). Pode ser ativa ou passiva. Se existirem vários devedores solidários passivos, cada um deles responde pela dívida inteira. O devedor que cumprir sozinho a prestação pode cobrar, regressivamente, a quota- parte de cada um dos co-devedores (CC, art. 283).
LEMBRE-SE: Nos três casos só há necessidade
de saber se uma obrigação é divisível, indivisível ou solidária quando há multiplicidade de devedores ou de credores.
• Obrigações de meio e de resultado: na primeira o devedor promete
empregar seus conhecimentos, meios e técnicas para a obtenção de determinado resultado, sem no entanto responsabilizar-se por ele. Ex.: advogados, médicos, etc.; na segunda o devedor dela se exonera somente quando o fim prometido é alcançado. Se não for alcançado responderá pelos prejuízos do insucesso. Ex.: transportador – levar o passageiro são e salvo a seu destino, cirurgião plástico no caso de trabalho de natureza estética.
• Obrigações civis e naturais: a primeira encontra respaldo no direito
positivo, podendo seu cumprimento ser exigido pelo credor, por meio de ação; na segunda o credor não tem o direito de exigir a prestação, e o devedor não está obrigado a pagar, todvia se este, voluntariamente, paga, não cabe o pedido de restituição da importância (retenção – único efeito que o direito positivo dá à obrigação natural) Ex.: dívida prescrita CC art. 882 e dívida de jogo CC art. 814. • Obrigações de execução instantânea, diferida e periódica: Quanto ao momento em que devem ser cumpridas, as obrigações classificam-se em: a) momentâneas ou de execução instantânea, que se consumam num só ato, sendo cumpridas imediatamente após sua constituição, ex.: como na compra e venda à vista; b) de execução diferida, cujo cumprimento deve ser realizado também em um só ato, mas em momento futuro, ex.: entrega, em determinada data, do objeto alienado; c) de execução continuada ou de trato sucessivo, que se cumpre por meio de atos reiterados, como ocorre na prestação de serviços, na compra e venda a prazo ou em prestações periódicas etc.
• Obrigações líquidas e ilíquidas: líquida – certa quanto à sua exis-
tência, e determinada quanto ao seu objeto - expressa por uma cifra, por um algarismo; Ilíquida, ao contrário, é a que depende de prévia apuração, pois o seu valor, o montante da prestação, apresenta-se incerto.
• Obrigações principais e acessórias: as primeiras subsistem por si,
sem depender de qualquer outra, ex.: entregar a coisa, no contrato de compra e venda; as segundas têm sua existência subordinada a outra relação jurídica, ou seja, dependem da obrigação principal, ex.: fiança, juros, etc. Vale ressaltar que a nulidade da obrigação principal implica a das obrigações acessórias, mas a recíproca não é verdadeira, pois a destas não induz a da principal (CC art. 184, 2a parte).
BIBLIOGRAFIA
FIGUEIREDO, Fábio Vieira. Direito Civil: direito das obrigações. São
Paulo: Rideel, 2007.
GAGLIANO, Pablo Stolze. Novo curso de direito civil, volume II:
obrigações / Pablo Stolze Gagliano, Rodolfo Panplona Filho. 9 .ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2008.
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil brasileiro, volume 2: teoria
geral das obrigações. 5. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2008.
MONTEIRO, Washington de Barros, Curso de Direito Civil, v.4: direito das
obrigações, 1ª Parte: das modalidades, das obrigações, dos efeitos das obrigações, do inadimplemento das obrigações. 32.ed. atual. Por Carlos Alberto Dabus Maluf. São Paulo: Saraiva, 2003.
PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito civil: teoria geral
das obrigações. 19. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2004. v.2.
VENOZA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: teoria geral das obrigações e
teoria geral dos contratos. 8. ed. São Paulo: Atlas, 2008. (Coleção direito civil; v.2).
VIANA, Marco Aurélio Silva. Curso de direito das obrigações. 1.ed. Rio de Janeiro: Forense, 2007. b.