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Regras de dedução natural

Desidério Murcho

A dedução natural é um método de demonstração introduzido


independentemente por Gerhard Gentzen em 1935 e Stanislaw Jaskowski em
1934. Os sistemas de dedução natural caracterizam-se, entre outros aspectos,
por não apresentarem um conjunto de axiomas e regras de inferências, mas
apenas um conjunto de regras. Neste artigo apresentaremos um conjunto de
regras primitivas de dedução natural, reservando para o final algumas
considerações sobre as vantagens deste sistema, que hoje em dia suplantou
já, nos meios filosóficos, os sistemas axiomáticos. Os vários sistemas hoje
existentes diferem ligeiramente em algumas das regras mais subtis. Neste
artigo apresentaremos a versão de Newton-Smith (Lógica: Um Curso
Introdutório,trad. de Desidério Murcho, Gradiva, Lisboa, 1998).
Um dos aspectos mais interessantes dos sistemas de dedução natural
resulta do facto de exigirem que as derivações exibam, em cada passo, as
premissas das quais esse passo depende. Esta exigência não existe nos
sistemas axiomáticos. A seu tempo, veremos uma importante consequência
lógico-filosófica desta exigência. Para já, é útil dar uma ideia de como ela
funciona.
Uma demonstração é constituída por 4 colunas. Na coluna 1 — a coluna
das dependências — exibem-se as dependências lógicas. Se o passo em causa
for uma premissa escreve-se Prem, se for uma suposição escreve-se Sup. Caso
contrário teremos de escrever o número da premissa ou suposição da qual o
nosso passo depende (caso dependa de alguma). A coluna 1 é também
conhecida como coluna do cálculo do conjunto de premissas.
A diferença entre premissas e suposições é a seguinte: muitas vezes, no
decurso de uma derivação, queremos introduzir fórmulas a título hipotético,
as quais serão, a seu tempo, eliminadas. Chamamos «suposições» a estas
fórmulas.
Na coluna 2 limitamo-nos a numerar os passos da nossa derivação. É a
coluna da numeração.
Na coluna 3 efectuamos o cálculo propriamente dito: é nesta coluna que
apresentamos as fórmulas que estamos a manipular. É a coluna do cálculo.
Na coluna 4 justificamos a inferência apresentada na coluna 3. É a
coluna da justificação. Nesta coluna afirmamos que o nosso passo resulta, por
exemplo, do passo (4), por uma aplicação da regra da eliminação da
conjunção.
O estudante tem tendência para confundir o papel da coluna da
justificação com a coluna das dependências. Afinal, se justificámos um
resultado apelando para o passo (4), para retomar o nosso exemplo, parece
óbvio que na coluna das dependências terá de surgir o número 4. Um dos
resultados do estudo da lógica é a tomada de consciência de que nem tudo o
que parece óbvio é verdade e este é um desses casos. Se o passo (4) do nosso
exemplo não for uma premissa nem uma suposição, o número que devemos
inscrever na coluna das dependências não é 4. Isto acontece porque o que nos
interessa é registar as premissas das quais o nosso resultado depende.
Na verdade, como veremos melhor a seu tempo, se tomarmos as
fórmulas referidas na coluna das dependências juntamente com as fórmulas
inscritas na coluna 3, obtemos um sequente sintáctico válido. (Em muitos
sistemas de dedução natural, com regras ligeiramente diferentes quanto ao
funcionamento das dependências, esta afirmação não é verdadeira.)
Na apresentação das regras usamos as letras A, B, C como variáveis de
fórmula e p, q, r como variáveis proposicionais. Isto significa
que A → B representa qualquer proposição que tenha a forma de uma
condicional. p → q tem a forma de uma condicional e é uma dessas fórmulas.
Mas (p ∧ q) → (r ∨ (p ∧ q)) também tem a forma de uma condicional e,
consequentemente, também é uma dessas fórmulas.

Eliminação da conjunção (E∧)

Dada uma linha da forma A ∧ B, tanto podemos inferir A como B. O resultado


depende de A ∧ B, caso esta linha seja uma premissa ou uma suposição. Caso
contrário, depende das mesmas premissas ou suposições de
que A ∧ B depender. Esta regra corresponde à nossa intuição semântica de
que se for verdade que Cavaco Silva é irritante e Salazar era um ditador,
Salazar era um ditador. Eis um exemplo da aplicação da regra:
Pre (1 p∧
m ) q

1 (2 p 1
) E∧

Na coluna 4, a coluna da justificação, indicamos o número da linha a que


aplicamos a regra, 1, e indicamos a regra aplicada, E∧.

Introdução da conjunção (I∧)

Dada uma linha da forma A e outra linha da forma B, tanto podemos


inferir A ∧ B como B ∧ A. O resultado depende de A e de B (caso sejam
premissas ou suposições) ou das premissas ou suposições de
que A e Bdependerem. Esta regra corresponde à nossa intuição semântica de
que se for verdade que Portugal é um país culturalmente atrasado e se for
também verdade que Heidegger era nazi, será verdade que Portugal é um país
culturalmente atrasado e que Heidegger era nazi. Por exemplo:
Pre (1
p
m )

Pre (2
q
m )

(3 p∧ 1,2
1,2
) q I∧

Na coluna 4, a coluna da justificação, indicamos o número das linhas a que


aplicamos a regra, 1 e 2, e indicamos a regra aplicada, E∧.
Repare-se que a nossa regra autoriza-nos a usar duas vezes o mesmo
passo. Podemos, pois, derivar o seguinte:
Pre (1
p
m )

(2 p∧ 1,1
1
) p I∧

Eliminação da negação (E¬)


Dada uma linha da forma ¬¬A podemos inferir A. A conclusão ficará a
depender de ¬¬A (caso esta seja uma premissa ou uma suposição) ou das
premissas ou suposições de que ¬¬A depender. Esta regra corresponde à nossa
intuição semântica de que se não for verdade que a filosofia não é aborrecida,
será verdade que a filosofia é aborrecida. Por exemplo:
Pre (1 ¬
m ) ¬p

(2 1
1 p
) E¬

Justificamos o nosso raciocínio na coluna 4, indicando que usámos a regra E¬


sobre o passo 1.
Os intuicionistas recusam esta regra, por acharem que nem sempre
podemos concluir que Pedro é corajoso só porque ele nunca mostrou que não
o era. Por causa desta recusa, têm de introduzir uma regra adicional, a
chamada regra da falsidade, que lhes permitirá fazer inferências por reductio.

Introdução da negação (I¬)

Esta regra é ligeiramente menos óbvia do que as anteriores. A ideia geral é a


seguinte: se no decorrer de um raciocínio alcançarmos uma contradição,
podemos negar qualquer uma das premissas da qual essa contradição
dependa. Isto corresponde à nossa intuição semântica segundo a qual se numa
conversa alguém afirmar que o João está no cinema e não está no cinema,
podemos negar qualquer uma das premissas que o nosso interlocutor usou
para alcançar tão profunda conclusão.
Dada uma linha da forma B ∧ ¬B que dependa da uma suposição A,
podemos concluir ¬A. A nossa conclusão já não irá depender de A; dependerá
apenas das outras premissas ou suposições de que B ∧ ¬Beventualmente
depender. Por exemplo, podemos derivar o sequente p → q ¬(p ∧ ¬q) do
seguinte modo:
Pre (1
p→q
m )
(2
Sup p ∧ ¬q
)

(3
2 p 2 E∧
)

(4 1,3
1,2 q
) E→

(5
2 ¬q 2 E∧
)

(6
1,2 q ∧ ¬q 4,5 I∧
)

(7 ¬(p ∧
1 2,6 I¬
) ¬q)

Justificamos o nosso raciocínio do passo (7) afirmando que estamos a negar a


fórmula do passo (2) com base na contradição deduzida no passo (6).
Este estilo de raciocínio é conhecido desde a antiguidade clássica e
recebeu o nome definitivo na idade média: reductio ad absurdum. Todavia, o
seu funcionamento é diferente daquele que ocorre nos sistemas axiomáticos.
Num sistema axiomático, a partir do momento em que chegamos a uma
contradição, podemos negar qualquer uma das fórmulas anteriores. No nosso
caso, só podemos negar aquela suposição da qual a contradição dependa.
Repare-se na seguinte derivação errada (em muitos sistemas de dedução
natural esta derivação não é errada, pois não se exige que a contradição
dependa da premissa a negar):
Pre (1
p
m )

Pre (2
¬p
m )

(3
Sup ¬q
)
(4 p∧ 1,2
1,2
) ¬p I∧

(5 3,4
1,2 ¬¬q
) I¬

O erro do passo (5), no sistema que estamos a apresentar, consiste no facto


de, com base na contradição da linha (4), termos negado a fórmula (3); no
entanto, a contradição não dependia de (3). Por isso, a derivação está errada.
No entanto, uma derivação análoga a esta seria correcta num sistema
axiomático e em outros sistemas de dedução natural.
A nossa «derivação» anterior procurava mostrar que de premissas
contraditórias tudo se segue: p, ¬p q. Mas porque só podemos negar um
passo do qual a contradição dependa, a derivação correcta deste resultado
tem de ser a seguinte:
Pre (1
p
m )

Pre (2
¬p
m )

(3
Sup ¬q
)

(4 1,2
1,2 p ∧ ¬p
) I∧

1,2, (5 (p ∧ ¬p) ∧ 3,4


3 ) ¬q I∧

1,2, (6
p ∧ ¬p 5 E∧
3 )

(7 3,6
1,2 ¬¬q
) I¬

1,2 (8 q 7 E¬
)

Repare-se que, à excepção das premissas e suposições, no sistema de Newton-


Smith, cada passo de uma derivação representa um sequente válido. Na
derivação anterior, o passo (4) representa o sequente p, ¬p p ∧ ¬p. O passo
(7) representa o sequente p, ¬p ¬¬q.
Muitos sistemas de lógica não exigem que o passo a negar, ao encontrar
uma contradição, dependa dessa contradição. Isto acontece porque, como
vimos, a introdução e a eliminação da conjunção nos permite sempre fazer
depender qualquer passo de uma derivação de qualquer outro. No entanto, se
mantivermos a nossa exigência, somos obrigados a tornar explícito o que de
outro modo fica apenas implícito.

Eliminação da condicional (E→)

Dada uma linha da forma A e uma outra da forma A → B, podemos inferir B. A


nossa conclusão dependerá das mesmas premissas e suposições de
que A e A → B dependerem, ou delas mesmas, caso se trate de premissas ou
suposições. Esta regra corresponde ao modus ponens, uma das regras mais
amplamente usadas em todos os sistemas dedutivos.
A regra corresponde à nossa intuição de que se for verdade que se o
João estiver em Paris, estará em França e se for verdade que ele
efectivamente está em Paris, então teremos a garantia de que ele está em
França. Por exemplo:
Pre (1
p
m )

Pre (2 p→
m ) q

(3 1,2
1,2 q
) E→

Na coluna da justificação invocamos as duas premissas usadas e citamos a


regra.

Introdução da condicional (I→)


A sintaxe desta regra é fácil de perceber e aplicar e é uma das mais úteis nos
sistemas de dedução natural. Todavia, a sua justificação semântica não é fácil
de perceber, pois implica já alguma familiaridade com a lógica.
Dada uma linha de uma derivação que dependa de uma suposição A e
afirme B, podemos inferir A →B. Por exemplo:
Pre (1
q
m )

(2
Sup p
)

(3 1,2
1,2 p∧q
) I∧

(4 p→ 2,3
1
) (p ∧ q) I→

Dado que o passo (3) depende de (2), podemos concluir que a fórmula do
passo (2) implica a fórmula do passo (3). A nossa nova fórmula já não depende
de (2), mas apenas de (1).
Esta regra é muito usada nas derivações cuja conclusão seja uma
condicional. Repare-se que o sequente demonstrado acima é o seguinte: q
p → (p ∧ q). A conclusão do sequente é uma condicional cuja antecedente foi
introduzida na derivação anterior como uma suposição que depois eliminámos
através da regra I→.

Eliminação da disjunção (E∨)

Juntamente com a regra da eliminação do quantificador existencial, esta é a


regra mais subtil dos sistemas de dedução natural. É por isso útil usar
dispositivos visuais (enquadramentos) que ajudem a perceber e a controlar as
nossas derivações.
A justificação semântica da regra é fácil de perceber. Se alguém afirmar
que o João está em Paris ou em Londres, podemos concluir que ele está na
Europa. Porquê? Porque se estiver em Paris, podemos concluir que está na
Europa; e se estiver em Londres podemos também concluir que está na
Europa; portanto, em qualquer caso, estará na Europa.
Dada uma fórmula da forma A ∨ B, podemos concluir C, caso C se
derive independentemente de A e de B. A nossa conclusão, C, dependerá
unicamente de A ∨ B e de quaisquer outras premissas usadas nas duas
demonstrações de C, excepto de A e de B. Por exemplo:
Pre (1 (p ∧ q) ∨
m ) (q ∧ r)

(2
Sup p∧q
)

(3
2 q 2, E∧
)

(4
Sup q∧r
)

(5
4 q 4, E∧
)

(6 1,2,3,4,5
1 q
) E∨

Na coluna 4, justificamos o nosso raciocínio com base no facto de a disjunção


do passo (1) possibilitar as duas subderivações, (2)-(3) e (4)-(5). Na coluna das
dependências registamos as suposições e premissas das quais (1), (3) e (5)
dependem, excepto (2) e (4). No nosso caso, ficamos apenas a depender de
(1). Mas se o nosso passo (5) dependesse de uma outra premissa qualquer, n,
que não fosse (4), o passo (6) ficaria a depender de 1 e de n.
Os enquadramentos mostram claramente que as duas derivações
de q são independentes: na coluna das dependências de (5) não pode surgir a
suposição (2). Esta restrição significa que a segunda derivação de qnão pode
depender da suposição (2). Por outro lado, tanto (3) como (5) têm de
depender das duas suposições respectivas. Isto significa que, como afirma a
regra, q deriva de p ∧ q e deriva também de q ∧r.

Introdução da disjunção (I∨)


Dada uma fórmula da forma A, tanto podemos inferir A ∨ B como B ∨ A. A
nossa conclusão ficará a depender unicamente de A, caso se trate de uma
premissa ou suposição, ou das premissas ou suposições das quais A depender,
caso contrário.
É fácil compreender a justificação semântica desta regra. Se for verdade
que está a chover, a previsão que fiz ontem de que hoje iria chover ou fazer
muito vento terá sido verdadeira.
Eis um exemplo de aplicação da regra:
Pre (1
p
m )

(2 p∨ 1
1
) q I∨

Eliminação da bicondicional (E↔)

Dada uma fórmula da forma A ↔ B podemos inferir (A → B) ∧ (B → A). A


nossa conclusão irá depender de A↔ B ou das premissas ou suposições de
que A ↔ B depender. Esta regra corresponde perfeitamente à semântica
intuitiva da expressão «se, e só se». Por exemplo:
Pre (1
p↔q
m )

(2 (p → q) ∧
1 1 E↔
) (q → p)

Introdução da bicondicional (I↔)

Dada uma fórmula da forma A → B e uma outra da forma B → A, podemos


inferir A ↔ B. A nossa conclusão dependerá das duas fórmulas referidas, ou
das premissas ou suposições de que elas dependerem. Por exemplo:
Pre (1
p→q
m )

Pre (2
q→p
m )
(3
1,2 p↔q 1,2 I↔
)

Concluímos assim a apresentação das regras de eliminação e introdução dos


operadores proposicionais. Precisamos agora de apresentar as regras de
introdução e eliminação dos quantificadores para dar conta do fragmento
predicativo da lógica clássica.
Usaremos letras como A, B para referir arbitrariamente qualquer
fórmula, t, u para referir qualquer termo (um nome próprio ou um nome
arbitrário). Usaremos ainda letras como a, b como nomes
arbitrários,m, n como nomes próprios e F, G como predicados. Por
exemplo, At refere uma qualquer fórmula A com pelo menos uma ocorrência
de um termo t, como Fa ou Fn. Letras como x, y serão usadas como variáveis,
que serão ligadas pelos quantificadores habituais, ∀ e ∃.

Eliminação do quantificador universal (E∀)

Dada uma fórmula da forma ∀x Ax, podemos inferir At. t tanto pode ser um
nome arbitrário, a, como um nome próprio, n; mas, em qualquer caso, tem de
substituir todas as ocorrências de x em Ax. Por exemplo:
Pre (1
∀x Fxm
m )

Pre (2
∀y (Gy ∧ Fy)
m )

(3
1 Fnm 1 E∀
)

(4
2 Gn ∧ Fn 2 E∀
)

(5 (Gn ∧ Fn) 3,4


1,2
) ∧ Fnm I∧
Ao justificar a regra citamos a linha à qual a estamos a aplicar. O resultado da
aplicação da regra ficará a depender da fórmula de partida, ou das premissas
ou suposições das quais aquela depende.
Esta regra é fácil de usar e a sua semântica é bastante fácil de perceber.
Se todas as pessoas são mortais, podemos com segurança afirmar que Salazar,
que era, tangencialmente, uma pessoa, era, felizmente, mortal.

Introdução do quantificador universal (I∀)

Esta regra é um pouco mais subtil, em resultado do papel reservado aos


nomes arbitrários, algo que no nosso quotidiano usamos sem reparar. Trata-se
de um dispositivo muito útil. A ideia é a seguinte: imagine que estamos a
fazer um estudo sociológico sobre os membros da Sociedade Portuguesa de
Filosofia. Queremos fazer uma série de raciocínios acerca de tão distinta
população, mas não queremos estar sempre a afirmar «Todos os membros da
SPF...» Por isso, acabamos por dizer coisas como: «o membro da SPF que não
tiver as quotas em dia não pode votar na assembleia geral». É claro que não
estamos a falar de um membro específico; estamos a falar de qualquer um.
Em lógica, para evitar confusões, fazemos como em geometria: usamos um
nome arbitrário em vez da expressão «o», que corre o risco de confundir-se
com uma descrição definida.
Ao chegar à conclusão do nosso estudo sobre os hábitos dos membros da
SPF, podemos querer eliminar o uso elíptico de «o» e dizer explicitamente:
todos os membros da SPF têm direito a assistir às conferências, seminários e
outras actividades da SPF. Por outras palavras, queremos substituir um nome
arbitrário por um quantificador universal. Por exemplo:
Pre (1 ∀x (Fx →
m ) Gx)

Pre (2
∀x Fx
m )

(3
1 Fa → Ga 1 E∀
)

(4
2 Fa 2 E∀
)
(5 3,4
1,2 Ga
) E→

(5
1,2 ∀x Gx 5 I∀
)

A partir do passo (3) começámos a falar dos F e dos G usando nomes


arbitrários. Depois de concluirmos algo de importante, resolvemos afirmá-lo
mais claramente, reintroduzindo o quantificador universal que tínhamos
eliminado antes.
Dada uma fórmula da forma Aa, podemos inferir ∀x Ax, desde
que Aa não seja uma premissa nem uma suposição, nem dependa de nenhuma
premissa ou suposição na qual ocorra o nome arbitrário a. O sentido destas
restrições é garantir que estamos a introduzir o quantificador universal numa
ocorrência estritamente arbitrária de um nome — não queremos inferir que
todos os sócios da SPF são louros só porque o Fernando Ferreira é louro.
Ao concluir ∀x Ax a partir de Aa, temos de substituir todas as
ocorrências de a por x. O resultado da introdução do quantificador universal
dependerá das premissas ou suposições das quais Aa depender.

Introdução do quantificador existencial (I∃)

Esta é a regra mais simples e óbvia do fragmento predicativo da dedução


natural. Corresponde à nossa intuição semântica segundo a qual se for
verdade que o Cavaco Silva é antipático, podemos concluir que alguém é
antipático, o tipo de pensamento que não apetece nada ter às segundas-feiras
de manhã. Mas é claro que podemos tirar a mesma conclusão, ainda que
estejamos a usar um nome arbitrário, em vez de um nome próprio.
A formulação da regra é assim a seguinte: dada uma fórmula da
forma At, podemos inferir ∃x Ax. ttanto pode ser um nome arbitrário, a,
como um nome próprio, n. A nossa conclusão dependerá de At, ou das
premissas ou suposições de que At depender. Por exemplo:
Pre (1
Fn
m )
Pre (2
Ga
m )

(3
1 ∃ x Fx 1 I∃
)

(4
2 ∃y Gy 2 I∃
)

(5 ∃x Fx ∧ ∃y 3,4
1,2
) Gy I∧

Ao contrário do que acontecia no caso do quantificador universal, não temos


de substituir todas as ocorrências de t por x ao introduzir o quantificador
existencial; podemos substituir só algumas. Se tivermos uma fórmula
como Fnn, podemos concluir ∃x Fxn.

Eliminação do quantificador existencial (E∃)

Esta regra é a mais subtil de toda a dedução natural e é fácil de perceber


porquê. É claro que do facto de alguém ser antipático não podemos concluir
que Heidegger era antipático; talvez ele fosse um nazi excepcionalmente
risonho. Para garantir que não chegamos a conclusões disparatadas a partir de
premissas razoáveis temos de introduzir várias restrições à eliminação do
quantificador existencial.
Para compreender a regra é útil começar por apresentar um exemplo do
seu uso:
Pre (1 ∃x (Fx ∧
m ) Gx)

(2
Sup Fa ∧ Ga
)

(3
2 Fa 2 E∧
)

2 (4 ∃x Fx 3 I∃
)

(5 1,2,4
1 ∃ x Fx
) E∃

Em primeiro lugar, repare na semelhança relativamente à regra E∨ : uma vez


mais, temos enquadramentos e uma vez mais temos uma conclusão geral que
repete uma conclusão surgida numa subderivação. A suposição (2) resulta da
substituição de todas as ocorrências de x por a na fórmula do passo (1). O
passo (4) depende de (2), mas já não contém nenhuma ocorrência de a. Além
disso, à excepção da suposição (2), (4) não depende de nenhuma premissa ou
suposição na qual a ocorra. Nestas condições, podemos inferir (5),
dependendo da premissa que deu origem à suposição (2) e de todas as
premissas das quais (4) dependa, excepto (2).
A formulação da regra é, pois a seguinte: dada uma fórmula da forma
∃x Ax, introduza-se Aa como suposição, substituindo-se em Aa todas as
ocorrências de x por um nome arbitrário, a. Derive-se agora C a partir de Aa.
Podemos concluir C, sem depender de Aa, desde que se respeitem as
seguintes condições:

1. C depende de Aa (é isso que significa dizer que derivámos C a partir


de Aa)
2. C não contém nenhuma ocorrência de a.
3. C não depende de nenhumas premissas ou suposições que contenham a,
excepto Aa.
4. A nossa conclusão geral ficará a depender de ∃x Ax e de todas as
premissas de que C depender, excepto Aa.

No caso da nossa derivação ilustrativa, C era ∃x Fx. Isto pode gerar a


confusão, uma vez que estamos a usar a regra da eliminação do quantificador
existencial para concluir uma derivação que contém um quantificador
existencial. Temos de compreender que o que conta é que alcançámos uma
conclusão a partir de uma suposição que eliminou o quantificador existencial
de (1). Podíamos ter chegado a uma conclusão sem quantificador existencial.
Por exemplo:
Pre (1 ∀x Fx
m )

(2
Sup ∃x ¬Fx
)

(3
Sup ¬Fa
)

(4
1 Fa 1 E∀
)

(5
1,3 Fa ∧ ¬Fa 3,4 I∧
)

(6
3 ¬∀x Fx 1,5 I¬
)

(7 2,3,6
2 ¬∀x Fx
) E∃

(8 ∀x Fx ∧
1,2 1,7 I∧
) ¬∀x Fx

(9
1 ¬∃x ¬Fx 2,8 I¬
)

Terminámos assim a apresentação do fragmento predicativo da dedução


natural. Resta-nos apresentar mais duas regras, que alargam o poder da nossa
lógica de um modo particularmente útil à filosofia, sobretudo à metafísica.
Refiro-me às regras da introdução e eliminação da identidade, que são muito
simples.

Introdução da identidade (I=)

Qualquer objecto é idêntico a si próprio. Logo, a frase de identidade, a = a,


ou n = n, pode ser introduzida em qualquer passo da nossa derivação, sem
depender de nenhumas premissas. Por exemplo:
Su (1 Fn
p )

(2
n=n I=
)

(3 1,2
1 Fn ∧ n = n
) I∧

(4 Fn → 1,3
) (Fn ∧n = n) I→

Repare-se que ao usar o passo (2) não ficamos na sua dependência.

Eliminação da identidade (E=)

Dada uma fórmula t = u, sendo t e u nomes próprios, e dada outra fórmula


qualquer na qual ocorra t, comoAt, podemos inferir Au. Au resulta de At por
substituição de pelo menos uma ocorrência de u em Au por t.A nossa
conclusão dependerá de t = u e de At, ou das premissas ou suposições de que
elas dependerem. Por exemplo:
Pre (1 m=
m ) n

Pre (2
Fm
m )

(3 1,2
1,2 Fn
) E=

Esta regra corresponde à nossa intuição de que se for verdade que António
Gedeão é Rómulo de Carvalho, tudo o que for verdade de António Gedeão
será verdade de Rómulo de Carvalho.
Apesar de esta regra ser de uma clareza irrepreensível há contextos nos
quais a sua aplicação dá origem a falácias. Chamam-se intensionais a esses
contextos.
Concluímos assim a apresentação das regras primitivas de dedução
natural para a lógica clássica. Com estas regras apenas é possível gerar
demonstrações económicas de alguns dos teoremas mais importantes da lógica
e de algumas das formas mais comuns de argumentos dedutivos. No entanto,
podemos acrescentar a estas regras primitivas uma regra de inserção de
teoremas que nos permitirá introduzir em qualquer derivação qualquer
teorema da lógica clássica, o que permitirá obter resultados ainda mais
económicos. Podemos também introduzir uma regra de introdução de
sequentes que nos permitirá introduzir qualquer sequente derivável no
decurso de uma derivação.
Além de oferecer demonstrações geralmente bastante mais económicas
do que as demonstrações dos sistemas axiomáticos, os sistemas de dedução
natural têm outras vantagens. Uma das mais importantes é o facto de tornar
evidente que a lógica não consiste (ou, pelo menos, não consiste apenas) no
estudo das verdades lógicas, mas antes no estudo da inferência dedutiva. A
sua importância filosófica torna-se assim irrecusável, uma vez que grande
parte dos argumentos dos filósofos são dedutivos.
Para terminar, resta-nos referir algumas variações no estilo de
demonstrações em dedução natural. Alguns autores indicam as dependências,
na coluna 1, entre colchetes, {}, transmitindo assim a ideia de que estão a
apresentar o conjunto de dependências. Esta prática tem a vantagem de
tornar ainda mais claro o facto de na dedução natural cada passo de uma
demonstração exibir um sequente válido, uma vez que um sequente
como p, p → q q é constituído por um conjunto de premissas: {p, p → q}.
Outra variação menor diz respeito à indicação das suposições e
premissas. Alguns autores não distinguem premissas de suposições. Outros
autores indicam a presença de premissas não na coluna 1, como nós, mas na
coluna 4. Na coluna 1 colocam o número do passo no qual estamos a
introduzir a própria premissa ou suposição. Este método tem vantagens na
exposição das regras.
Os enquadramentos usados nas regras E∃ e E∨ não são usados por muitos
autores, mas são uma ajuda preciosa para o estudante. Por outro lado, alguns
autores suprimem a coluna 1, substituindo-a por traços verticais que indicam
as dependências em causa. Outros ainda fazem todas as derivações dentro de
caixas, de modo que as dependências são imediatamente visíveis. Qualquer
que seja a variação, o método de dedução natural revela-se um instrumento
filosófico flexível e imprescindível.
Desidério Murcho
Retirado de Enciclopédia de Termos Lógico-Filosóficos, org. João Branquinho e Desidério Murcho
(Gradiva, 2001)

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