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PROPOSTA TÉCNICA DO

PROGRAMA NACIONAL DA POLÍTICA


DE ORDENAMENTO DO TERRITÓRIO
Parecer da Ad Urbem
Associação para o Desenvolvimento do Direito do Urbanismo e da Construção

A. Introdução
B. Organização do parecer
C. Programa legislativo
D. Normas urbanísticas
E. Programas de acção territorial
F. Meios de financiamento
G. Comissão consultiva
H. Legislar melhor
I. Recomendações

A. INTRODUÇÃO

1. No termo do período de discussão pública da proposta técnica do Programa Nacional da


Política de Ordenamento do Território (PNPOT), a Ad Urbem congratula-se com o
facto de se encontrarem reunidas as condições para o XVII Governo Constitucional
preparar a proposta de lei a apresentar à Assembleia da República, proposta que, tudo o
indica, irá ser convertida na versão final deste importante instrumento de gestão
territorial.

2. Com o presente parecer, Ad Urbem pretende contribuir para o aperfeiçoamento da


proposta técnica do PNPOT, em termos de habilitar o Governo com um conjunto de
sugestões e recomendações que facilitem a obtenção de um desejável consenso em torno
das soluções que, em termos materiais e formais, vierem a ser consagradas na proposta
de lei a debater pela Assembleia da República.

3. A Ad Urbem está vocacionada para abordar os aspectos em que a proposta técnica do


PNPOT promove, ou não, o avanço do direito do urbanismo e da construção,
especialmente nos casos em que está em jogo uma participação mais activa dos
cidadãos no governo do território.

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Proposta técnica do PNPOT, | Parecer da Ad Urbem

4. A perspectiva adoptada pela Ad Urbem traz a primeiro plano os direitos, as liberdades e


as garantias dos cidadãos colocados à guarda da Assembleia da República e relembra-
nos que as questões de ordem técnica a que necessariamente se refere o PNPOT não
devem obscurecer as opções de ordem política nele contidas.

5. Nesse sentido, menos importante que a presente tomada de posição, será o parecer que a
Ad Urbem se propõe emitir sobre a proposta de lei a apresentar pelo Governo à
Assembleia da República, uma vez que, nessa altura, deixamos de estar perante um
documento técnico que vincula, em primeira linha, as entidades participantes na
elaboração do PNPOT e passamos a lidar com um documento que explicita a política de
ordenamento do território e de urbanismo que o Estado, as Regiões Autónomas e as
autarquias locais devem respeitar e fazer respeitar.

6. A Ad Urbem espera que os resultados da discussão pública da proposta técnica do


PNPOT habilitem o Governo a redigir uma proposta de lei que, sem transigir na defesa
dos princípios que regem a política de ordenamento do território e do urbanismo
– designadamente, dos princípios gerais consagrados Lei de Bases da Política de
Ordenamento do Território e de Urbanismo (LBPOTU)1 –, seja passível de obter o mais
amplo consenso entre os partidos políticos com assento parlamentar.

7. O alcance de uma plataforma política alargada, capaz de transmitir à opinião pública a


convicção de o PNPOT está a ser encarado como uma questão suprapartidária, é
essencial ao adequado cumprimento do dever de ordenar do território, que a lei consagra
nos seguintes termos:
O Estado, as Regiões Autónomas e as autarquias locais devem promover, de forma articulada,
políticas activas de ordenamento do território e de urbanismo, nos termos das suas atribuições e
das competências dos respectivos órgãos, de acordo com o interesse público e no respeito pelos
direitos, liberdades e garantias dos cidadãos2.

1
Veja-se a Lei n.º 48/98, de 11 de Agosto, artigo 5.º, “Princípios gerais”: a política de ordenamento do
território e de urbanismo obedece aos princípios gerais da sustentabilidade e solidariedade
intergeracional, da economia, da coordenação, da subsidiariedade, da equidade, da participação, da
responsabilidade, da contratualização e da segurança jurídica.
2
Id., artigo 4.º, “Dever de ordenar o território”, n.º 1.

2
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B. ORGANIZAÇÃO DO PARECER

8. A proposta técnica do PNPOT refere-se a um conjunto muito variado de matérias e


contem propostas que podem ser apreciadas de pontos de vistas muito diversos. Para
conter a nossa exposição dentro de limites que facilitem a compreensão das ideias que,
nesta fase, importa transmitir a quem de direito há que seleccionar os aspectos que mais
directamente respeitam à esfera de acção da Ad Urbem, centrada no desenvolvimento
do direito do urbanismo e da construção.

9. Assim, no presente parecer a Ad Urbem propõe-se tão somente discutir:


• Concepção e desenvolvimento do programa legislativo que, nos termos do regime
jurídico dos instrumentos de gestão territorial, deve estar contido no Programa de
Acção do PNPOT3;
• Autocontenção da componente normativa do PNPOT, designadamente comprovado
pelo silêncio que envolve a questão das normas urbanísticas de âmbito nacional;
• Minimização do papel a desempenhar pelos programas de acção territorial4 na
execução de uma política de ordenamento do território e de urbanismo;
• Omissão da componente do Programa de Acção do PNPOT respeitante ao
enquadramento plurianual dos meios de financiamento da acção territorial5 do
Estado, das Regiões Autónomas e das autarquias locais;
• Governamentalização da comissão consultiva do PNPOT e necessidade de corrigir
uma opção institucional que coloca Portugal à margem do padrão europeu;
• Renúncia a uma visão codificadora da legislação urbanística portuguesa,
descontinuando opções de política legislativa subjacentes à reforma de 1998-1999

3
Decreto-Lei n.º 380/99, de 22 de Setembro, artigo 29.º, “Conteúdo documental”, n.º 3, alínea b): o
programa de acção do PNPOT estabelece os compromissos do Governo em matéria de medidas
legislativas necessárias à concretização da política de desenvolvimento territorial.
4
Lei n.º 48/98, artigo 17.º, "Programas de acção territorial", n.º 1: a coordenação das actuações das
entidades públicas e privadas interessadas na definição da política de ordenamento do território e de
urbanismo e na execução dos instrumentos de planeamento territorial pode ser enquadrada por
programas de acção territorial.
5
Lei n.º 48/98, artigo 17.º, "Programas de acção territorial", n.º 1: a coordenação das actuações das
entidades públicas e privadas interessadas na definição da política de ordenamento do território e de
urbanismo e na execução dos instrumentos de planeamento territorial pode ser enquadrada por
programas de acção territorial.

3
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que hoje se encontram confirmadas e reforçadas pelo programa legislar melhor da


União Europeia.

10. A questão do programa legislativo do PNPOT é colocada à cabeça do parecer não


apenas porque se trata de um tema que interessa em especial a Ad Urbem, mas também
porque a dignidade com que é tratada esta matéria constitui uma medida da importância
atribuída pelo Governo à intervenção da Assembleia da República na aprovação do
instrumento de gestão territorial que aqui nos interessa. Um programa legislativo de
contornos mal definidos e constituído por medidas frouxamente fundamentadas é um
indício de que não se espera, da instância parlamentar, a assunção de uma posição muito
clarividente no momento em que é chamada a apreciar e a aprovar o PNPOT.

11. Os conceitos de “parâmetros de acesso às funções urbanas” 6 e de “padrões de qualidade


de vida” 7 não são muito familiares no âmbito das políticas territoriais praticadas entre
nós, habituados, como estamos, a falar em normas urbanísticas. Entretanto, da União
Europeia chegam os standards e alarga-se o âmbito da soft law, o que significa a criação
de um novo ambiente normativo, que certamente irá influenciar a execução do PNPOT
e concepção dos instrumentos que se propõem desenvolver as políticas nele definidas.
Mais recentemente, os novos planos regionais de ordenamento do território têm
insistido na expressão “normas orientadoras”, sem que se saiba exactamente qual o peso
normativo que se pretende conferir a essa expressão, aliás também adoptada na proposta
técnica do PNPOT8.

12. A debilidade normativa da proposta técnica nem, ao menos, é compensada pela sua
componente programática. Estamos perante um instrumento de natureza estratégica e o
desenvolvimento das medidas nele contidas pressupõe uma conjugação de esforços
entre entidades públicas e privadas. A lei oferece o programa de acção territorial como
um instrumento especificamente destinado a contratualizar essas relações, desde que em

6
Decreto-Lei n.º 380/99, artigo 27.º, “Objectivos”, n.º 3, alínea f): o PNPOT visa estabelecer os
parâmetros de acesso às funções urbanas e às formas de mobilidade.
7
Id., artigo 28.º, "Conteúdo material", n.º 1: o PNPOT, concretizando as opções definidas no plano
nacional de desenvolvimento económico e social, define um modelo de organização espacial que
estabelece os padrões mínimos e os objectivos a atingir em matéria de qualidade de vida e de
efectivação dos direitos económicos, sociais, culturais e ambientais.
8
Programa de Acção, pg. : Serão futuramente desenvolvidas regras para elaboração de normas
orientadoras para os Planos Regionais de Ordenamento do Território, em execução directa das
directrizes que resultam do PNPOT, as quais conjugadas com as presentes orientações devem ser
observadas pelas diversas entidades intervenientes nos procedimentos de planeamento.

4
Proposta técnica do PNPOT, | Parecer da Ad Urbem

consonância com a política de ordenamento do território e de urbanismo.


Inexplicavelmente, a proposta técnica do PNPOT atribui a esse instrumento um papel
pouco mais do que irrelevante.

13. O escamoteamento dos programas de acção territorial tem, no entanto, a evidente


vantagem de fazer passar a secundaríssimo plano uma questão essencial: sendo o
PNPOT um programa concebido para um horizonte temporal de vinte anos9, como
garantir, enquadrar e mobilizar, ao longo da sua vigência, os meios de financiamento
das acções territoriais nele previstas? A acuidade desta dúvida mais se evidencia quando
tomamos consciência de que boa parte dessas acções territoriais dependem do apoio
financeiro prestado pela União Europeia e de parcerias Estado-municípios e público-
privadas. Ora, o bom aproveitamento dos apoios prestados pela União pressupõe a
disciplina de programas plurianuais, enquadrados pelo Orçamento do Estado. Ignorar
estes aspectos equivale a descredibilizar o PNPOT ou, pelo menos, corresponde a
reduzi-lo à condição de um documento cheio de boas intenções, cuja execução não é
possível avaliar em termos objectivos.

14. A concepção da proposta técnica do PNPOT é fruto de um longo processo de gestação


não muito feliz para a comissão consultiva onde estavam representadas as entidades da
sociedade civil. O que aqui interessa salientar é a necessidade de Portugal colocar esta
questão institucional num pé mais consentâneo com a sua condição de país europeu.
Felizmente, este desiderato pode ser facilmente satisfeito, bastando, para isso, a
valorização do papel desempenhado pelo Conselho Económico e Social na preparação
da posição da Assembleia da República face à proposta de lei respeitante ao PNPOT e
no acompanhamento da execução desta programa.

15. Finalmente, o mesmo desejo de alinhamento com o que de melhor se pratica na Europa
leva-nos a esperar que a concepção e a execução do programa legislativo do PNPOT
sejam avaliadas à luz dos critérios legísticos que hoje regem a actividade legislativa da
Comissão das Comunidades Europeias, critérios que se encontram consubstanciados no
programa legislar melhor. À luz desta expectativa e atendendo ao estado em que se
encontra a legislação urbanística portuguesa, a questão da sua simplificação é apenas
uma das componentes de uma reforma necessária, a par da qual se deverá colocar as
questões da codificação, da eliminação das normas supérfluas ou caídas em desuso, da

9
Ver Programa de Acção do PNPOT, § 7, pg. 2.

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co-regulação da gestão territorial, bem como da avaliação do impacto do acervo das leis
e regulamentos urbanísticos na economia nacional e, em especial, no produto interno
bruto.

C. PROGRAMA LEGISLATIVO

16. A proposta técnica de PNPOT deveria conter um programa legislativo claramente


formulado para o seu período de vigência e organizado em termos que permitam a sua
actualização periódica de acordo com o ritmo previsto na lei, pautado pela discussão
pública e pela aprovação parlamentar dos relatórios sobre o estado de ordenamento do
território nacional, a elaborar, de dois em dois anos, pelo Governo10.

17. Infelizmente, as medidas legislativas contidas na proposta técnica do PNPOT são


apresentadas de tal forma que, em muitos casos, não é possível destrinçá-las das
medidas não legislativas.

18. As linhas que se seguem resultam de uma primeira tentativa para fazer a referida
separação, sendo certo que temos plena consciência do carácter precário do resultado
obtido.
Política ambiental
i. Regulamentar os usos e acções insusceptíveis de afectar o equilíbrio ecológico nas áreas de REN, e
redefinir os critérios para delimitação dessas áreas, distinguindo os objectivos de conservação da
natureza e da biodiversidade dos objectivos da prevenção de situações de risco (medida prioritária
1.2.1; 2006).
ii. Elaborar uma lei-quadro de conservação da natureza e da biodiversidade que clarifique o conteúdo,
o regime jurídico e os instrumentos da política de conservação da natureza (1.2.3; 2006)
iii. Regulamentar a Lei n.º 58/2005 (lei da água), que transpôs para a ordem jurídica interna a directiva
quadro da água (Directiva n.º 2000/60/CE), estabelecendo o regime de utilização dos recursos
hídricos e o correspondente regime económico e financeiro (1.5.1; 2006).
iv. Elaborar um normativo legal que regule a gestão do litoral, valorize o recurso água e promova uma
visão global da costa nas vertentes terrestre e marinha (1.6.1; 2006-2007).
v. Criar e implementar a rede nacional de áreas marinhas protegidas, definindo as suas condicionantes
temporais e territoriais e regulamentando as actividades humanas, de modo a fomentar a produção
de recursos piscícolas e o desenvolvimento sustentável da pesca costeira artesanal (1.7.3; 2006-
2013).

10
Ver Decreto-Lei n.º 380/99, artigo 146.º, "Relatório sobre o estado do ordenamento do território", n.º
1.

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vi. Simplificar e agilizar os procedimentos de licenciamento das infra-estruturas e equipamentos de


produção de energia de fonte renovável, nomeadamente no interface entre a economia e o ambiente
com respeito pelos procedimentos ambientais (1.9.2; 2006-2007).
vii. Integrar na avaliação estratégica de impactes de planos e programas e na avaliação de impacte
ambiental a avaliação de riscos naturais, ambientais e tecnológicos, em particular dos riscos de
acidentes graves envolvendo substâncias químicas perigosas (1.11.2; 2006-2103).
viii. Ordenar e regulamentar a utilização dos espaços de prática de desporto de natureza, dentro e fora de
áreas protegidas, para promover um desenvolvimento consonante com as regras de preservação
ambiental (4.5.4; 2006-2009).

Política cultural
ix. Regulamentar a lei de bases do património cultural, promovendo a articulação com os instrumentos
de gestão territorial (1.10.6; 2006-2007).

Política de transportes
x. Rever o quadro legal para que nas áreas metropolitanas de Lisboa e do Porto se verifique uma maior
articulação entre o desenvolvimento de novas urbanizações e o sistema de transportes,
nomeadamente através do condicionamento da aprovação de planos de pormenor e do
licenciamento de loteamentos à avaliação dos seus impactes no sistema de mobilidade (3.3.1;
2006-2009).

Política regional
xi. Estabelecer regras que condicionem a uma avaliação de impacto regional o financiamento público
de infra-estruturas e equipamentos económicos desenvolvidos fora de um quadro de cooperação
intermunicipal, considerando, em particular, a viabilidade de idênticos projectos já realizados ou
programados para espaços vizinhos (3.4.1; 2006-2007).

Política de finanças locais


xii. Introduzir mecanismos de contratualização entre o Estado e as autarquias locais para o
desenvolvimento de programas e projectos diferenciadores nos domínios da economia, da
investigação e desenvolvimento, dos serviços urbanos, da cultura, do desporto e da imagem da
cidade (2.1.5; 2006-2013).
xiii. Introduzir nos instrumentos de financiamento das autarquias e das infra-estruturas e equipamentos
locais mecanismos incentivadores da cooperação intermunicipal (2.3.1; 2006-2008).

Política de urbanismo
xiv. Reforçar a componente estratégica dos planos directores municipais, integrando no seu conteúdo a
definição de opções sobre a dimensão e as formas de desenvolvimento urbano mais adequadas aos
respectivos territórios (3.3.2; 2006-2009).
xv. Incentivar novas parcerias para o desenvolvimento de programas integrados de reabilitação,
revitalização e qualificação das áreas urbanas, reforçar e agilizar o papel das sociedades de
reabilitação urbana e rever o enquadramento fiscal e financeiro das operações integradas nestes
programas (3.3.4; 2006-2009).
xvi. Promover mecanismos de combate à especulação fundiária, incluindo a fixação de prazos máximos
razoáveis dentro dos quais direitos adquiridos, designadamente por actos ou contratos de conteúdo
urbanístico, caducam sem direito a indemnização (3.3.5; 2006-2007).
xvii. Incentivar o cumprimento de objectivos sociais por parte dos promotores imobiliários,
designadamente através da afectação de uma quota parte de habitação nova ou a reabilitar a
pessoas com carências económicas, por exemplo, na construção de habitação social ou em
operações integradas de revitalização urbana, contribuindo para o desenvolvimento de comunidades
urbanas sustentáveis (4.3.1; 2006-2013).

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xviii.Actualizar e simplificar a base jurídica e os procedimentos administrativos com repercussão no


ordenamento do território e no urbanismo, promovendo a sua eficiência e a melhor articulação entre
as várias entidades públicas envolvidas (6.2.1; 2006-2007).
xix. Simplificar o relacionamento dos cidadãos com as entidades com competência no licenciamento de
projectos com impacte territorial, através da concentração dos serviços de atendimento e de
processamento, numa óptica de balcão único (6.2.2; 2006-2009).
xx. Reforçar as competências municipais em matéria de ordenamento do território, responsabilizando as
autarquias pela qualidade dos planos, pela sua conformidade com os instrumentos territoriais de
ordem superior e pela sua execução em tempo útil (6.2.3; 2006-2008).
xxi. Reforçar os mecanismos de acesso à informação no âmbito da elaboração dos instrumentos de
gestão territorial, conduzindo a uma maior co-responsabilização e envolvimento da sociedade civil
(6.3.1; 2006-2007).
xxii. Rever os modelos de acompanhamento e de participação previstos no regime jurídico dos
instrumentos de gestão territorial, no sentido de garantir o maior envolvimento das entidades
públicas e das organizações económicas, sociais, culturais e ambientais desde a fase inicial de
definição do conteúdo e das principais opções desses instrumentos (6.3.3; 2006-2007).

C.1 Política ambiental

19. Perante o significativo peso das medidas de natureza ambiental, ocorre perguntar: todas
ou algumas destas medidas não deveriam antes figurar numa nova versão do Plano
Nacional da Política de Ambiente (PNPA), aprovado em 1995 e cuja revisão tem sido
adiada até aos nossos dias11?

20. O esclarecimento da anterior dúvida deveria constar da proposta técnica do PNPOT, o


qual apenas se refere ao PNPA no quadro da política da água12, em termos que sugerem
a sua pela validade, o que, no mínimo, é desmentido pelo silêncio do Instituto do
Ambiente13.

21. Estas indefinições são geradoras de alguma perplexidade, aliás reforçada pela
circunstância de estar em elaboração um Plano Nacional de Ambiente e Saúde, para
2005-201014, integrado no Plano de Acção Europeu Ambiente e Saúde 2004-201015.

11
O PNPA foi aprovado pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 38/95, de 21 de Abril; nos termos
do n.º 4 desta resolução, o PNPA seria objecto de um processo anual de avaliação e controlo de
execução.
12
Ver o § 48 do Relatório da proposta técnica do PNPOT.
13
No site do Instituto do Ambiente (http://www.iambiente.pt) não é possível colher qualquer informação
sobre a eventual revisão ou actualização do PNAP ou mesmo sobre a sua actual validade.
14
O respectivo grupo de trabalho foi criado pelo Despacho conjunto n.º 38/2005, de 11 de Janeiro.

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C.2 Política cultural

22. O desenvolvimento da Lei de Bases do Património Cultural (2001)16 deveria ter sido
concluído no prazo de um ano após a sua aprovação na Assembleia da República.
Contudo, a comissão responsável pela regulamentação desta lei de bases apenas foi
publicamente apresentada no dia 14 de Fevereiro do corrente ano17.

23. Decorrido quase um ano sobre a entrada em funcionamento da referida comissão, será
que está a ser efectivamente conseguida a desejada a articulação da lei de bases com os
instrumentos de gestão territorial?

24. Não é possível responder a esta pergunta, pelo menos com base nos dados disponíveis
no e.government português.

25. Esta falta de publicidade pode ser generalizada a outras situações em que estão em
estudo regulamentos que, sendo de âmbito nacional, se destinam a disciplinar a
actividade urbanística das autarquias locais e dos particulares.

C.3 Política de transportes

26. A única medida prioritária do Programa de Acção da proposta técnica do PNPOT que
expressamente se refere aos planos de pormenor dá a entender que o legislador pretende
aumentar o número os requisitos a que se sujeita a aprovação destes instrumentos. Se
essa é a intenção, corre-se o risco de tornar mais ainda mais complexo e demorado um
procedimento por todos reconhecido como kafkiano.

27. Questiona-se igualmente se a escala adequada para esta avaliação será a do planeamento
de pormenor quando os seus impactos são de escala metropolitana e dependem das
estratégias concelhias e regional.

15
O PNAS não é expressamente mencionado nem no Relatório nem na Programa de Acção da proposta
técnica do PNPOT. Em todo caso, este último documento refere-se à “Estratégia da Comunidade
Europeia em Matéria de Saúde”.
16
Lei nº 107/2001, de 8 de Setembro.
17
Sobre esta matéria veja-se a intervenção da Ministra da Cultura na apresentação da Comissão
nomeada para regulamentar a Lei de Bases do Património Cultural, disponível no Portal do Governo:
http://www.portugal.gov.pt/Portal/PT/Governos/Governos_Constitucionais/GC17/Ministerios/MC/Co
municacao/Intervencoes/20060214_MC_Int_Comissao_Patrimonio.htm

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28. Finalmente, por que motivo se sobrecarrega o plano de pormenor com estas novas
exigências quando se sabe, à partida, que a maior parte das novas urbanizações
aprovadas para as áreas metropolitanas – e para todo o País – são enquadradas por
erzatz de planos de pormenor (projectos de operações de loteamento, projectos de
condomínios, projectos de conjuntos turísticos, etc., etc.).

C.4 Política regional

29. Caso seja aceite o princípio de avaliação de impacto regional o financiamento público
de empreendimentos desenvolvidos fora de um quadro de cooperação intermunicipal,
talvez se justifique, em sentido simétrico e complementar, o princípio da avaliação do
impacto local de grandes infra-estruturas e equipamentos de âmbito regional, sobretudo
no que respeita aos efeitos incentivadores da dispersão do povoamento.

C.5 Política de finanças locais

30. A LBPOTU consagra o princípio da contratualização18 e prevê os instrumentos


destinados a assegurar a sua concretização: os já referidos programas de acção
territorial. Assim sendo, não se percebe muito bem por que motivo a proposta técnica do
PNPOT se propõe “introduzir” no sistema de gestão territorial aquilo que dele já faz
parte.

31. Estas e outras confusões do mesmo estilo levam-nos a suspeitar que o autor da proposta
técnica do PNPOT não se apercebeu que a lei exige que este instrumento estabeleça as
condições de realização dos programas de acção territorial previstos na LBPOTU19.

18
Lei n.º 48/98, artigo 5.º, “Princípios gerais”, alínea h): a política de ordenamento do território e de
urbanismo obedece ao princípio geral de contratualização, incentivando modelos de actuação
baseados na concertação entre a iniciativa pública e a iniciativa privada na concretização dos
instrumentos de gestão territorial.
19
Decreto-Lei n.º 380/99, artigo 29.º, “Conteúdo documental”, n.º 3, alínea d): o programa de acção do
PNPOT estabelece as condições de realização dos programas de acção territorial previstos no artigo
17.° da LBPOTU.

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C.6 Política de urbanismo

32. Não iremos aqui comentar, uma a uma, medidas legislativas enquadráveis na política de
urbanismo. Apenas adiantaremos alguns comentários sobre opções que ou poderiam ser
mais rigorosamente formuladas, ou que merecem ser aplaudidas pela Ad Urbem.

33. O regime jurídico dos instrumentos de gestão territorial já contém medidas destinadas
quer a combater a especulação fundiária, mediante a fixação de prazos máximos
razoáveis para a realização dos empreendimentos urbanísticos20, quer a incentivar o
cumprimento de objectivos sociais por parte dos promotores imobiliários21. Assim, antes
de se inovar nestas matérias, cumpre averiguar por que motivo anteriores e idênticas
medidas não surtiram o desejado efeito.

34. As medidas de simplificação da base jurídica e dos procedimentos administrativos com


repercussão no ordenamento do território e no urbanismo são sempre bem-vindas,
atendendo à superlativa complexidade do sistema de gestão territorial que hoje vigora
entre nós. Se essa simplificação caminhar no sentido do reforçar as competências
municipais (o mesmo é dizer, as responsabilidades dos municípios) em matéria de
ordenamento do território, maior aplauso merece tal iniciativa.

35. A proposta técnica do PNPOT não prevê qualquer iniciativa legislativa respeitante ao
desenvolvimento do sistema nacional de informação territorial previsto na LBPOTU22 e
no regime jurídico dos instrumentos de gestão territorial23. Este silêncio do PNPOT
contrasta com a azáfama com outras estratégias nacionais de carácter sectorial que estão
a pôr de pé os seus próprios sistemas de informação, num movimento que ameaça
pulverizar os dados territoriais, dispersando-os por compartimentos estanques. Assim,
justifica-se retomar o objectivo de, mediante lei, estabelecer os princípios básicos que

20
Decreto-Lei n.º 380/99, artigo 128.º, “Expropriação”, n.º 2, alíneas b), c) e d). Ver também o Decreto-
Lei n.º 794/76, de 5 de Novembro, (Lei de Solos), artigo 41.º, n.º 1, alíneas a), b) e c).
21
Decreto-Lei n.º 794/76, artigo 6.º, n.º 1: na execução de qualquer plano de expansão, desenvolvimento
ou renovação urbanas, ou de novos aglomerados, serão sempre fixados os números ou pertencentes
dos fogos a construir, sujeitos a fixação ou contrôle dos valores das rendas ou dos preços de venda,
além dos destinados a habitação social.
22
Lei n.º 48/98, artigo 29.º, "Acompanhamento da política de ordenamento do território", n.º 2: a lei
deve estabelecer a criação de um sistema nacional de dados sobre o território, articulado aos níveis
regional e local.
23
Decreto-Lei n.º 380/99, artigo 147.º, "Sistema nacional de informação territorial": o observatório
referido no artigo 144.º promoverá a criação e o desenvolvimento de um sistema nacional de dados
sobre o território, integrando os elementos de análise relevantes aos níveis nacional, regional e local.

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Proposta técnica do PNPOT, | Parecer da Ad Urbem

hão-de reger a arquitectura do referido sistema, sendo esse o contexto mais adequado
para reforçar os mecanismos de acesso da sociedade civil à informação no âmbito da
elaboração dos instrumentos de gestão territorial24.

36. Também é de aplaudir o propósito de rever os modelos de acompanhamento e de


participação previstos no regime jurídico dos instrumentos de gestão territorial, no
sentido de garantir o maior envolvimento das entidades públicas e das organizações
económicas, sociais, culturais e ambientais desde a fase inicial de definição do conteúdo
e das principais opções desses instrumentos. Mutatis mutantis, as mesmas exigências
são aplicáveis ao acompanhamento dos regulamentos de natureza urbanística cuja
elaboração corre pelos serviços do Estado.

C.7 Erros e omissões

37. Às anteriores considerações há ainda que acrescentar duas ordens de preocupações,


sinteticamente englobáveis naquilo que poderemos designar por erros e omissões da
proposta técnica do PNPOT.

38. Por um lado, importa proceder a uma revisão cuidadosa do Relatório e do Programa de
Acção do PNPOT por forma a deles expurgar eventuais “gralhas” ou redacções menos
felizes. A título de exemplo, seria conveniente esclarecer que o Decreto-Lei n.º 151/95,
de 24 de Junho, sobre o regime jurídico dos planos especiais de ordenamento do
território, foi expressamente revogado pelo Decreto-Lei n.º 380/99 e não foi
posteriormente repristinado25. Certamente por deficiente entendimento desse facto, os
regulamentos dos planos de ordenamento da orla costeira continuam a dispor sobre
matérias que a lei hoje reserva para o âmbito da execução do planeamento territorial e
que coloca sob a exclusiva competência dos municípios, como é o caso da delimitação
de unidades operacionais de planeamento e gestão e de unidades de execução.

39. Também consideramos menos feliz a fórmula “reforçar as competências municipais em


matéria de ordenamento do território, responsabilizando as autarquias pela qualidade
dos planos, pela sua conformidade com os instrumentos territoriais de ordem
superior.”26 Como responsabilizar as autarquias pela qualidade dos planos se o PNPOT

24
A título de exemplo veja-se a Loi relative au système d'information du territoire, de 17 de Março de
2000, em vigor no Cantão de Genebra
25
Decreto-Lei n.º 380/99, artigo 159.º, “Norma revogatória”, do)
26
Programa de Acção, pgs. 55 e 91.

12
Proposta técnica do PNPOT, | Parecer da Ad Urbem

se demite de fixar os padrões mínimos e os objectivos a atingir em matéria de qualidade


de vida e de efectivação dos direitos económicos, sociais, culturais e ambientais? E
quando se fala em instrumentos de ordem superior será que se pretende redesenhar o
sistema de gestão territorial à luz do princípio da hierarquia, quando este hoje assenta no
princípio da personalidade e, designadamente, reserva para os municípios a
responsabilidade da definição do regime de uso do solo? É que se essa responsabilidade
lhes for retirada, voltamos à antiga situação em que a hierarquia prevalecia sobre a
personalidade e em que os municípios apenas podiam exercer as suas competências
urbanísticas à sombra do poder de planeamento do Estado. Como se sabe, esta é a
melhor forma de desresponsabilizar o poder local.

40. Por outro lado, e este aspecto assume alguma gravidade à luz do princípio da boa fé que
deve reger as relações entra as diversas entidades, públicas e privadas que participaram
na elaboração da proposta técnica do PNPOT, é difícil perceber por que motivo não
mereceram acolhimento as sugestões da comissão consultiva no sentido de serem
superadas omissões flagrantes essa mesma proposta. Entre tais omissões, destacamos as
seguintes:
a) Parâmetros de acesso às funções urbanas27;
b) Directrizes para o dimensionamento de áreas de cedência obrigatória28;
c) Padrões em matéria de qualidade de vida29;
d) Coordenação dos planos sectoriais com incidência territorial30;

27
Parecer da Comissão Consultiva do PNOPOT, pg. 5: Desconformidade entre a proposta de PNPOT e
os objectivos previstos no artigo 27.º do Decreto-Lei n.º 380/99, de 22/9, nomeadamente: [...] quanto à
alínea f) - “estabelecer os parâmetros de acesso às funções urbanas e às formas de mobilidade” – a
proposta nada diz sobre parâmetros gerais, nem justifica a sua ausência.
28
Id. pg. 5: Assinala-se que a proposta de PNPOT não contém directrizes para o dimensionamento de
áreas de cedência obrigatória, não assinala esta omissão, nem a justifica. Só há uma referência na
orientação/medida 3.2.10, não são cumpridos os artigos 27.º, f) e 28.º, 1 c) do DL n.º 380/99, de 22/9,
nem o 8.º/b) da L n.º 48/99, de 11/8, e o 43.º do DL n.º 555/99, de 16/12. Considera-se que, apesar de
o nível adequado para a definição dos parâmetros de aproveitamento do solo ser o âmbito municipal,
os níveis regional e nacional não se alheiam por completo desta matéria, uma vez que a Lei de Bases
atribui aos instrumentos elaborados nos âmbitos nacional e regional a competência para enquadrar o
planeamento desenvolvido pelos municípios e superar as suas eventuais omissões.
29
Id. pg. 6: O Programa de Políticas é omisso no que diz respeito à alínea c) do artigo 28.º --
estabelecer “os padrões mínimos e os objectivos a atingir em matéria de qualidade de vida e de
efectivação dos direitos económicos, sociais, culturais e ambientais” – e à alínea d) – “os objectivos
qualitativos e quantitativos a atingir em matéria de estruturas de povoamento, bem como de
implantação de infra-estruturas e de equipamentos estruturantes”.

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Proposta técnica do PNPOT, | Parecer da Ad Urbem

e) Critérios de reclassificação do solo rural como solo urbano31;


f) Compromisso do Governo em matéria de execução das medidas de política32;
g) Obliteração dos programas de acção territorial33.

41. Finalmente, também há que incluir entre as omissões da proposta técnica do PNPOT o
facto de nela não se fazer qualquer menção às iniciativas legislativas que, em matéria de
ordenamento do território e de urbanismo, têm por autores os partidos com assento
parlamentar34. Nem que seja por razões de cortesia e de lealdade parlamentar, essa
menção deveria ser feita, tanto mais que a Assembleia da República nem teve
oportunidade de influenciar a elaboração do PNPOT através da aprovação dos relatórios
sobre o estado de ordenamento do território nacional previstos na lei35 – e que o

30
Id. pg. 7: Insuficiente no que respeita às alíneas [...] g) (estabelecer “As medidas de coordenação dos
planos sectoriais com incidência territorial”) – considera-se esta insuficiência particularmente grave
pois a total desarticulação sectorial é um dos 25 grandes problemas para o ordenamento do território
identificados no Relatório do PNPOT.
31
Id. pg. 6: O Programa de Acção não dá completa prossecução às orientações da Resolução do
Conselho de Ministros n.º 76/2002, em particular é omisso quanto à regulamentação dos critérios de
reclassificação do solo rural como solo urbano.
32
Id. pg. 6: O conteúdo documental do Programa de Acção, incluindo o Programa das Políticas, tem,
relativamente ao artigo 29.º do Decreto-Lei n.º 380/99, de 22/9, omissão em relação à alínea b) do n.º
3 (estabelecer “os compromissos do Governo em matéria de medidas legislativas, de investimentos
públicos ou de aplicação de outros instrumentos de natureza fiscal ou financeira, para a concretização
da política de desenvolvimento territorial”).
33
Id. pg. 7: Insuficiência em relação à alínea d) do n.º 3, do art. 29.º (estabelecer “as condições de
realização dos programas de acção territorial (PAT) previstos no artigo 17.º da Lei de Bases da
Política de Ordenamento do Território e de Urbanismo”.
34
Veja-se, por exemplo, o Projecto de Lei n.º 285/X – Instrumentos de Gestão Territorial, da autoria de
Abílio Dias Fernandes (PCP), António Filipe (PCP), Bernardino Soares (PCP), Jerónimo de Sousa
(PCP), Agostinho Lopes (PCP), Jorge Machado (PCP), Miguel Tiago (PCP), Odete Santos (PCP),
Luísa Mesquita (PCP) e Honório Novo (PCP) [Diário da Assembleia da República, II série A, n.º
128/X/1, de 15 de Julho de 2006 (pg. 6-66)].
35
Decreto-Lei n.º 380/99, artigo 146.º, "Relatório sobre o estado do ordenamento do território", n.ºs 1, 4
e 5: o Governo elabora, de dois em dois anos, um relatório sobre o estado do ordenamento do
território, a submeter à apreciação da Assembleia da República. O relatório traduz o balanço da
execução dos instrumentos de gestão territorial objecto de avaliação, bem como dos níveis de
coordenação interna e externa obtidos, fundamentando uma eventual necessidade de revisão.
Concluída a sua elaboração, o relatório é submetido a um período de discussão pública de duração não
inferior a 30 dias.

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Proposta técnica do PNPOT, | Parecer da Ad Urbem

Governo se absteve de elaborar –, nem foi chamada a acompanhar, directa ou


indirectamente36, os trabalhos de elaboração da proposta de PNPOT.

42. A discussão da proposta de lei respeitante ao PNPOT, sendo uma ocasião soberana para
repensar as bases do ordenamento do território e do urbanismo em Portugal, mal se
compagina com práticas que, objectivamente, tendem a marginalizar a instituição
parlamentar37. Há que repensar esta questão à luz de critérios que dignifiquem a
participação da Assembleia da República na génese dos princípios reitores do PNPOT,
sem prejuízo da responsabilidade própria do Governo no que respeita ao
desenvolvimento e à concretização do programa de acção contido neste instrumento de
gestão territorial38.

D. NORMAS URBANÍSTICAS

43. A proposta técnica do PNPOT apresentou-se a discussão pública com uma omissão
flagrante numa matéria decisiva para a qualidade de vida dos cidadãos: a garantia da
existência de espaços, infra-estruturas e equipamentos destinados a satisfazer
necessidades de ordem colectiva.

44. Com efeito, a proposta em apreço ignora a seguintes disposições do regime jurídico da
urbanização e da edificação39:
1. Os projectos de loteamento devem prever áreas destinadas à implantação de espaços verdes e
de utilização colectiva, infra-estruturas viárias e equipamentos.
2. Os parâmetros para o dimensionamento das áreas referidas no número anterior são os que
estiverem definidos em plano municipal de ordenamento do território, de acordo com as
directrizes estabelecidas pelo Programa Nacional da Política de Ordenamento do Território e
pelo plano regional de ordenamento do território.

36
O acompanhamento indirecto poderia ter sido assegurado pelo Conselho Económico e Social,
entidade que, até agora, ainda não foi ouvida sobre a proposta técnica do PNPOT.
37
Recorde-se que tal marginalização corre ao arrepio da lei fundamental, uma vez que nos termos da
CRP, artigo 165.º, alínea z), é matéria da exclusiva competência da Assembleia da República, salvo
autorização ao Governo, legislar sobre as bases do ordenamento do território e do urbanismo.
38
Decreto-Lei n.º 380/99, artigo 34.º, "Aprovação": o PNPOT é aprovado por lei da Assembleia da
República, cabendo ao Governo o desenvolvimento e a concretização do programa de acção.
39
Decreto-Lei n.º 555/99, de 16 de Dezembro, artigo 43.º, "Áreas para espaços verdes e de utilização
colectiva, infra-estruturas e equipamentos",

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Proposta técnica do PNPOT, | Parecer da Ad Urbem

45. A omissão só não mais clamorosa devido à circunstância de o regime jurídico dos
instrumentos de gestão territorial não ser muito explícito no que respeita à componente
normativa do PNPOT; em todo caso, e como já tivemos ocasião de recordar40, é
manifesto que compete a este instrumento estabelecer:
a) Os parâmetros de acesso às funções urbanas e às formas de mobilidade;
b) Os princípios orientadores da disciplina de ocupação do território;
c) Os padrões mínimos e os objectivos a atingir em matéria de qualidade de vida e de
efectivação dos direitos económicos, sociais, culturais e ambientais;
d) Os objectivos qualitativos e quantitativos a atingir em matéria de estruturas de
povoamento, bem como de implantação de infra-estruturas e de equipamentos
estruturantes.

46. Perante disposições tão claras, pergunta-se como e onde deverá forma a componente
normativa do PNPOT?

47. Para responder a esta pergunta importa recuar às discussões suscitadas pelo anteprojecto
de Lei de Bases do Ordenamento do Território elaborado pelo XII Governo
Constitucional (1995) e no qual se previa um sistema de planeamento fortemente
dependente de normas urbanísticas elaboradas pelos serviços do Estado e aprovadas por
resolução do Conselho de ministros41.

48. A LBPOTU e o regime jurídico dos instrumentos de gestão territorial (1998-9)


constituem uma reacção à anterior opção e, por esse motivo, não emprestam grande
relevo às normas urbanísticas.

49. Para tornar mais claro o contraponto entre o anteprojecto de LBOT, de 1995, e a
LBPOTU, de 1998, podemos acrescentar que o primeiro documento inspirava-se
fortemente na lei espanhola, que precisamente se caracteriza por admitir a substituição
dos planos por normas subsidiárias do planeamento e que não hesita em incluir normas
urbanísticas nas actos que ocupam o topo do sistema legal42. Em contrapartida, a

40
Ver § # do presente parecer.
41
Ver Lei de Bases do Ordenamento do Território – Proposta de lei do XII Governo Constitucional, a
apresentar à Assembleia da República (Maio de 1995), em especial os capítulos dedicados às normas
provisórias (artigos 56.º a 59.º) e às normas supletivas (artigos 60.º a 62.º).
42
Tendência bem patente na Lei 9/2002, do 30 de decembro, de ordenación urbanística e protección do
medio rural de Galicia: http://laborate.usc.es/files/Lei_do_solo_refundida_2002_e_2004.pdf

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Proposta técnica do PNPOT, | Parecer da Ad Urbem

LBPOTU em vigor tem por principal fonte de inspiração as leis suíças,


reconhecidamente muito parcimoniosas na formulação de normas urbanísticas de
aplicação directa ou de carácter supletivo.

50. No entanto, o facto de o vigente sistema de gestão atribuir um lugar relativamente


modesto à normativa urbanística, isso não implica que o PNPOT ignore esta matéria.
Aliás, se o fizer, estará a deixar em aberto um campo que outros tenderão a ocupar. E é
isso que precisamente sucede neste momento, quando deparamos a tentativa de fazer
avançar um projecto de Regulamento Geral de Edificações, cujos títulos II e III são
respectivamente dedicados ao “meio ambiente” e à “qualidade do espaço edificado”43.

51. Dada a situação sumariamente descrita, bem se compreende a necessidade de esclarecer


os conceitos quer de “normas urbanísticas”, quer de “normas orientadoras”, quer ainda
de standards. Esta deveria ser uma das preocupações centrais da proposta técnica do
PNPOT, tanto mais que se trata de um instrumento destinado a ser aprovado pela
Assembleia da República. Aliás, atendendo a esta circunstância, a autocontenção do
discurso normativo do PNPOT poderá ser lida como uma tentativa de desvalorizar a
intervenção do órgão parlamentar na concepção da política de ordenamento do território
e de urbanismo, o que certamente não será uma leitura muito auspiciosa para essa
mesma política, no momento do seu nascimento.

52. Ora, o receio da menorização da instituição parlamentar mais se avoluma quando lemos,
a propósito da concepção dos planos regionais de ordenamento do território, que44:
Os sistemas estruturantes são, pelo menos, o sistema urbano e de relações urbano-rurais, o
sistema de protecção e valorização ambiental e o sistema de acessibilidades e mobilidade. A
cada sistema deve ser associado um número limitado de objectivos estratégicos e um conjunto
de regras fundamentais para a ocupação e gestão do território. Estas regras integram as Normas
Orientadoras, as quais traduzem princípios e critérios para a utilização dos recursos territoriais,
para a protecção e valorização ambiental, para a ocupação do solo e desenvolvimento urbano,
para a localização de actividades económicas e para o desenvolvimento das redes de
equipamentos e infra-estruturas ao nível regional.

53. Será que a contenção do discurso normativo da proposta do PNPOT é uma forma de
livre curso à inventiva regulamentatória dos planos regionais?

43
Ver Ordem dos Arquitectos, Parecer sobre o anteprojecto de revisão do Regulamento Geral das
Edificações Urbanas (RGEU): http://www.oasrn.org/pdf_upload/Revisao%20RGEU%20-
%20parecer%20aprovado%20CDN.pdf
44
Programa de Acção, pg. 67.

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Proposta técnica do PNPOT, | Parecer da Ad Urbem

54. Concluindo: a proposta técnica do PNPOT descura a sua componente normativa,


abrindo caminho para a dispersão das normas urbanísticas por actos legislativos
desenquadrados da LBPOTU, o que certamente irá aumentar o caos que, nesta matéria,
já hoje campeia no ordenamento do território e no urbanismo.

E. PROGRAMAS DE ACÇÃO TERRITORIAL

55. No caso de Portugal, o planeamento tende a claudicar quando os planos, ultrapassados


os escolhos da aprovação final, entram em fase de execução. O PNPOT dificilmente
conseguirá escapar a esta regra, mal grado o facto de o legislador, ao designá-lo, ter
abdicado da prestigiosa palavra “plano”, substituindo-a pela mais modesta palavra
“programa”, o que é uma forma de baixar as expectativas suscitadas pelo instrumento
que ocupa o lugar de topo do sistema de gestão territorial.

56. A nomenclatura do PNPOT testemunha pois um realismo político que tem toda a razão
de ser, atenta a recorrente ineficácia demonstrada pelos instrumentos de planeamento
quando é chegado o momento de passar à prática as medidas nele definidas.

57. Ora, em nome desse mesmo realismo, seria razoável esperar que o desenvolvimento das
medidas tendentes à organização do território nacional fosse confiada não apenas aos
instrumentos tradicionais de planeamento territorial, mas também aos programas de
acção territorial, isto é, aos novos instrumentos de carácter programático previstos na
LBOTPU. Mas não é essa a opção da proposta técnica do PNPOT, como imediatamente
fica demonstrado pela simples leitura do cabeçalho do quadro que sintetiza as medidas
prioritárias nele preconizadas (Quadro 1).

58. Para a adequada compreensão deste tópico, convém recordar que45:


1. A coordenação das actuações das entidades públicas e privadas interessadas na definição da
política de ordenamento do território e de urbanismo e na execução dos instrumentos de
planeamento territorial pode ser enquadrada por programas de acção territorial.
2. Os programas de acção territorial têm por base um diagnóstico das tendências de
transformação das áreas a que se referem, definem os objectivos a atingir no período da sua
vigência, especificam as acções a realizar pelas entidades neles interessadas e estabelecem o
escalonamento temporal dos investimentos neles previstos.

45
Lei n.º 48/98, artigo 17.º, “Programas de acção territorial”.

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Proposta técnica do PNPOT, | Parecer da Ad Urbem

Quadro 1: Cabeçalho da matriz das medidas prioritárias


Programa de Acção, pg. 75

N.º Medidas
PS PEOT PROT PIOT PMOT
de ordem Prioritárias

Plano Plano Plano Plano Plano


sectorial especial regional intermunicipal municipal
com incidência de ordenamento de ordenamento de ordenamento de ordenamento
territorial do território do território do território do território

3. A concretização dos programas de acção territorial é assegurada mediante acordo celebrado


entre as entidades neles interessadas.

59. Conhecidos o conteúdo e os contornos dos programas de acção territorial é possível


afirmar que a importância atribuída a estes instrumentos programáticos mede o
empenho do PNPOT em incentivar a cooperação entre o Estados e os municípios, e
entre estes e os particulares.

60. O Relatório do PNPOT ignora os programas de acção territorial e o seu Programa de


Acção apenas numa única ocasião se refere a estes instrumentos, concretamente quando,
no contexto das acções destinadas a “promover a participação cívica e institucional nos
processos de planeamento e desenvolvimento territorial”, inclui a seguinte medida:
Integrar os princípios e orientações das Agendas 21 Locais nos instrumentos de
desenvolvimento e gestão territorial e incentivar a cooperação aos níveis local e regional,
recorrendo nomeadamente à institucionalização de parcerias, à contratualização e à
implementação de Programas de Acção Territorial (2006-2009).

61. Neste ponto do nosso raciocínio haveria que consultar a Estratégia Nacional de
Desenvolvimento Sustentável (ENDS), para aquilatar do empenho posto pelo Governo
no estabelecimento de Agendas 21 Locais. Ora, caso aceitemos o parecer de uma
plataforma alargada de associações ambientalistas, a ENDS, pelo menos na versão que
foi submetida a discussão pública, impressiona negativamente pela:
[...] quase total ausência de referências à necessidade de levar o desenvolvimento sustentável ao
âmbito local ou, melhor ainda, de conseguir que este surja a partir de cada local, de cada
concelho para o todo nacional. Instrumentos como a Agenda 21 não merecem referência digna

19
Proposta técnica do PNPOT, | Parecer da Ad Urbem

de nota, parecendo não lhe ser dada qualquer relevância para um efectivo desenvolvimento
sustentável do país46.

62. Concluindo: à luz da proposta técnica do PNPOT, os programas de acção territorial


apenas merecem ser mencionados a par das estratégias locais de desenvolvimento
sustentável, sabendo-se que estas são displicentemente encaradas pela estratégia
nacional que se encontra em debate. Ou seja, aparentemente tudo indica que os referidos
programas estão destinados a ser uma pequena nota de rodapé, esquecida, algures, no
vasto sistema de gestão territorial.

F. MEIOS DE FINANCIAMENTO

63. Nos termos da lei, o programa de acção do PNPOT estabelece a identificação dos meios
de financiamento das acções propostas47.

64. Ora, o programa em apreço define objectivos gerais, objectivos específicos e medidas
prioritárias, sem estabelecer os meios financeiros para a sua prossecução. Perante a
evidência desta omissão, é razoável considerar que o Governo está, na prática, a impedir
a Assembleia da República de exercer os seus poderes de fiscalização, designadamente
no que se refere ao uso que o Estado faz dos dinheiros públicos. Ao estabelecer um
conjunto de medidas prioritárias que são programas plurianuais, mas sem lhes indexar o
esforço necessário para a sua prossecução, o Governo apresenta à aprovação na
Assembleia da República um conjunto significativo e pesado de compromissos para
com os quais os futuros orçamentos de Estado estarão implicados, sem que a instituição
parlamentar tenha o pleno conhecimento do nível desses compromissos.

65. Paradoxalmente, o Programa de Acção, ao não se conter na definição dos objectivos


gerais e específicos, das metas correspondentes e da orçamentação necessária para a sua
prossecução, perdendo-se na descrição de uma vastidão de medidas prioritárias, está a
envolver em demasia a Assembleia da República na tarefa da execução das políticas – o
que é uma incumbência do Governo –, e a limitar fortemente a possibilidade de
ajustamento das medidas no sentido de uma mais eficaz e mais eficiente concretização
dos objectivos assumidos com a aprovação da lei do PNPOT.

46
APEA, et al., 2006: pg. 3.
47
Decreto-Lei n.º 380/99, artigo 29.º, “Conteúdo documental”, n.º 3, alínea e).

20
Proposta técnica do PNPOT, | Parecer da Ad Urbem

66. Por outro lado, o Programa de Acção, ao não estabelecer metas para os objectivos
específicos definidos e ao introduzir no conjunto das medidas que enuncia alguns
programas em curso, autónomos ou inscritos noutras políticas, realizando uma
duplicação não desejável, está a inquinar a avaliação da concretização do PNPOT e a
impedir uma efectiva imputabilidade política ao seu executor, concretamente o
Governo.

67. Às anteriores considerações, advindas do modelo seguido na organização documental


da proposta técnica do PNPOT, há ainda que acrescentar as dificuldades inerentes à
actual conjuntura económica e financeira. Para maior esclarecimento deste ponto,
importa reter que Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional de Lisboa e
Vale do Tejo48:
considera que não é efectuado um levantamento das verbas envolvidas nas "Orientações/
Medidas" propostas, como decorre do artigo 29.º do Decreto-Lei n.º 380/99, de 22 de Setembro,
e que é fundamental face ao actual período de restrições orçamentais do Estado e dos
Municípios, e à previsível redução das comparticipações da União Europeia, pois receia-se que
não seja possível concretizar tão grande quantidade de "Orientações/Medidas" (a título de
exemplo, será possível que cerca de metade das "Orientações/Medidas" sejam comparticipadas
por Fundos Comunitários?) nas metas temporais estabelecidas, considerando-se assim útil o
estabelecimento de prioridades de actuação.

68. Concluindo: a não previsão dos meios de financiamento das acções preconizadas na
proposta de PNPOT constitui uma omissão que pode acarretar pesados efeitos negativos
para a futura sustentabilidade deste instrumento de gestão territorial.

G. COMISSÃO CONSULTIVA

69. O tom pessimista com que fechamos o anterior capítulo assume tonalidades mais
carregadas se tivermos em conta que a elaboração do PNPOT pode ser questionada com
base na exigência de coordenação das autoridades investidas do poder de planeamento
territorial49, o que pressupõe a valorização dos contributos prestados pelas entidades

48
Parecer da Comissão Consultiva do PNPOT, pgs. 6-7.
49
Decreto-Lei n.º 380/99, artigo 11.º, “Princípio geral”: a articulação das estratégias de ordenamento
territorial determinadas pela prossecução dos interesses públicos com expressão territorial impõe ao
Estado e às autarquias locais o dever de coordenação das respectivas intervenções em matéria de
gestão territorial.

21
Proposta técnica do PNPOT, | Parecer da Ad Urbem

exteriores à administração do Estado e a sua participação responsável na concepção e no


desenvolvimento da política de ordenamento do território e de urbanismo.

70. Atendendo à exigência de coordenação, uma política que se reclama do qualificativo de


nacional não pode ser o resultado de um processo de tomada de decisões em que a
Administração Central do Estado impõe a sua vontade aos demais parceiros que, por
direito próprio, são chamados a participar na concepção ou na execução dessa mesma
política.

71. A questão que acabamos de esboçar pode ser focalizada na constituição da comissão
consultiva que acompanhou a elaboração do PNPOT50, inicialmente formada por
representantes das seguintes entidades51:
a) Associação Nacional dos Municípios Portugueses;
b) Associação Nacional de Freguesias;
c) Confederação da Indústria Portuguesa;
d) Confederação do Comércio e Serviços de Portugal;
e) Associação Empresarial de Portugal;
f) Confederação dos Agricultores de Portugal;
g) Confederação Nacional da Agricultura;
h) Confederação do Turismo Português;
i) Confederação Geral dos Trabalhadores Portugueses;
j) União Geral de Trabalhadores;
k) Federação Portuguesa da Indústria da Construção e Obras Públicas;
l) Ordem dos Arquitectos;
m) Ordem dos Engenheiros;
n) Associação dos Urbanistas Portugueses;
o) Associação Portuguesa de Arquitectos Paisagistas;
p) Associação Portuguesa de Geógrafos;

50
Id., artigo 31.º, "Comissão consultiva do programa nacional da política de ordenamento do território":
A elaboração do programa nacional da política de ordenamento do território é acompanhada por uma
comissão consultiva, criada pela resolução do conselho de ministros referida no artigo anterior e
composta por representantes das Regiões Autónomas, das autarquias locais e dos interesses
económicos, sociais, culturais e ambientais relevantes.
51
Resolução do Conselho de Ministros n.º 76/2002, 11 de Março, 6. Note-se que não é prevista a
representação das Regiões Autónomas.

22
Proposta técnica do PNPOT, | Parecer da Ad Urbem

q) Confederação Portuguesa das Associações de Defesa do Ambiente.

72. Passados cerca de dois anos sobre o início da elaboração do PNPOT, quando faltavam
cinco meses para o encerramento dos trabalhos da comissão consultiva, o XVI Governo
Constitucional decidiu que esta comissão integrasse também os organismos da
administração do Estado representados no chamado “sistema de pontos focais”52.

73. Embora não se saiba ao certo qual o número de organismos do Estado envolvidos na
elaboração do PNPOT, estes não seriam menos de sessenta, isto é, três vezes mais do
que as dezoito entidades da sociedade civil representadas na comissão consultiva.

74. Embora fundamentada no “princípio da cooperação e da articulação entre os vários


sujeitos, públicos e privados, portadores de interesses a ponderar no âmbito da formação
dos planos”, a remodelação da comissão consultiva do PNPOT em condições que, na
prática, vieram abafar a voz das entidades exteriores à Administração Pública, constitui
uma iniciativa em flagrante contraste com aquilo que podemos designar por tradição
europeia.

75. Com efeito, na generalidade dos países que fazem parte da Europa dos Quinze, as
instâncias consultivas de âmbito nacional que participam na formação das políticas de
ordenamento do território não integram representantes dos serviços centrais ou
periféricos do Estado. como é o caso da Alemanha53, da Áustria54, da Bélgica
(Flandres55 e Valónia56), da França57, do Luxemburgo58 e dos Países Baixos59 – países a
que ainda podemos juntar a Suiça60.

52
Resolução do Conselho de Ministros n.º 162/2004, 11 de Novembro, 6.1 e 6.2. Este acto também
alargou a constituição originária da comissão consultiva, prevendo a representação da Associação
Profissional de Arqueólogos.
53
Alemanha: Beirat für Raumordnung: http://www.notre-europe.asso.fr/IMG/pdf/Ute.pdf
54
Áustria: Österreichische Raumordnungskonferenz (ÖROK): http://www.oerok.gv.at/
55
Flandres: De Sociaal-Economische Raad van Vlaanderen (SERV), responsável pelo tema
Ruimtelijke ordening, huisvesting, monumenten en landschappen: http://www.serv.be/
56
Valónia: Commission Régionale d'Aménagement du Territoire (CRAT), integrada no Conseil
Économique et Social de la Région Wallonne (CESRW): http://www.cesrw.be/pages/37_1.html
57
França: Conseil National de l'Aménagement et du Développement du Territoire (CNADT):
http://www.datar.gouv.fr/datar_Site/cnadt1.nsf/0/0c0534910bbb6cfbc1256a6b004f2a96?OpenDocum
ent
58
Luxemburgo: Conseil Supérieur de l'Aménagement du Territoire (CSAT)
http://www.legilux.public.lu/leg/a/archives/1992/0222304/0222304.pdf#page=5.

23
Proposta técnica do PNPOT, | Parecer da Ad Urbem

76. Na vizinhança de Portugal, apenas no caso do Reino de Marrocos61 deparamos com uma
comissão consultiva em que coexistem representantes da sociedade civil e dos serviços
do Estado.

77. Concluindo: a proposta de lei a submeter pelo Governo à aprovação da Assembleia da


República deverá esclarecer se o actual modelo de comissão consultiva é para manter ou
se, pelo contrário, há que o reformar de acordo com a tradição europeia.

H. LEGISLAR MELHOR

78. Uma maior participação da sociedade civil na feitura do PNPOT equivale à promessa de
uma maior transparência da política de ordenamento do território e de urbanismo.

79. A aposta política implícita no anterior parágrafo está na génese do programa


comunitário concebido sob o lema “legislar melhor”. No âmbito deste programa, não se
trata apenas de simplificar os procedimentos administrativos. Está também em jogo a
simplificação da legislação, passo necessário para permitir um maior envolvimento dos
cidadãos europeus na formação das políticas comunitárias.

80. Para mais bem sugerir a grande amplitude deste ponto de vista, podemos parafrasear o
Programa Legislativo da Comissão das Comunidades Europeias para o corrente ano de
2006. Assim, diríamos que “é necessário evitar que a legislação urbanística e os
procedimentos administrativos sejam excessivamente complicados, pois tal acarreta
custos reais para os cidadãos e as empresas”. Com o PNPOT, Portugal deverá “encetar
uma nova fase de simplificação da legislação, com uma consulta mais sistemática aos
interessados directos”. No quadro deste programa, será levado a cabo uma avaliação “da
legislação que eventualmente possa constituir uma sobrecarga desproporcionada para os
cidadãos e as empresas”62.

59
Países Baixos: Raad voor de Volkshuisvesting, de Ruimtelijke Ordening en het Milieubeheer
(VROM-raad) e Sociaal-Economische Raad (SER): http://www.vromraad.nl/ & http://www.ser.nl/
60
Suiça: Conférence de la Confédération pour l’organisation du territoire (COT) e Conseil de
l’organisation du territoire (COTER):
http://www.are.admin.ch/are/fr/raum/raumordnungsrat/index.html
61
Marrocos: Conseil Supérieur de l’Aménagement du Territoire (CSAT):
http://www.matee.gov.ma/dat/decret.htm
62
Comissão das Comunidades Europeias (2005).

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Proposta técnica do PNPOT, | Parecer da Ad Urbem

81. Gostaríamos de deixar aqui a sugestão de que os quadros com a matriz das medidas
prioritárias, publicado em anexo ao Programa de Acção do PNPOT, deverão seguir o
exemplo de idênticos quadros insertos nos programas legislativos da Comissão das
Comunidades Europeias e distinga entre “acções não legislativas” e “propostas
legislativas”, esclarecendo, neste caso, o tipo de acto adequado à concretização da
medida proposta (Quadro 2).

Quadro 2: Cabeçalho dos documentos prioritários para a adopção em 2006

Título Tipo de proposta Descrição do âmbito N.º


ou acto e objectivos

Acção não legislativa Comunicação da Comissão


Livro Verde
Livro Branco

Proposta legislativa Regulamento


Directiva
Decisão
Decisão-quadro
Convenção
Recomendação

82. Para além disso, importa lembrar que o programa “legislar melhor” advoga a
codificação63 e a reformulação64 dos textos legislativos, e que o Parlamento Europeu “é
de opinião que a codificação e a reformulação são os principais instrumentos de
simplificação do acervo comunitário e incentiva um recurso mais alargado a estes
instrumentos”.

63
Segundo o Glossário da Europa: A codificação constitutiva ou oficial corresponde à adopção de um
novo acto jurídico, publicado no Jornal Oficial (série L), que integra e revoga os actos que são objecto
de codificação (acto(s) de base + actos modificativos) sem alterar o respectivo conteúdo. A
codificação pode ser: (i) Vertical: integração de um acto de base e dos actos que o alteram num único
acto jurídico novo; (ii) Horizontal: integração de diferentes actos de base paralelos relativos ao mesmo
domínio, e suas alterações, num único acto jurídico novo. Ver: http://europa.eu/scadplus/glossary/
legislation_codification_pt.htm
64
Id.: A reformulação dos textos legislativos designa a adopção, aquando de uma nova alteração
introduzida no acto de base, de um novo acto jurídico que, ao integrar esta nova alteração, revoga o
acto de base. Contrariamente à codificação, a reformulação pressupõe a realização de alterações de
fundo. Permite igualmente obter uma perspectiva geral acerca de um domínio legislativo. O novo acto
jurídico é publicado no Jornal Oficial (Série L). Ver: http://europa.eu/scadplus/glossary/legislation
_recasting_pt.htm

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Proposta técnica do PNPOT, | Parecer da Ad Urbem

83. Será pois ao nível mais ambicioso da codificação e da reformulação da legislação


urbanística portuguesa que deverá ser posta a fasquia a transpor pelo PNPOT, no
seguimento, aliás, do esforço codificador da reforma operada em 1998-1999.

84. Concluindo: sem querer desmerecer a importância do SIMPLEX, a Ad Urbem considera


que programa de simplificação administrativa a que o actual Governo meteu ombros
deverá ser mais ambicioso no domínio da legislação urbanística, incluindo a sua
codificação entre os objectivos expressamente contemplados no PNPOT.

I. RECOMENDAÇÕES

85. A Ad Urbem conclui o presente parecer com duas notas que, em seu entender, permitem
encarar com alguma esperança e serenidade o debate político de onde certamente irá
sair a aprovação final do PNPOT.

86. A primeira nota é retirada da sessão solene realizada na Fundação Calouste Gulbenkian,
em Lisboa, no dia 17 de Maio do corrente ano, e que marcou o início da discussão
pública da proposta técnica do PNPOT. Ao intervir nessa sessão, o Primeiro Ministro,
José Sócrates disse65:
[...] querer encetar negociações com a Associação Nacional de Municípios para rever os
principais instrumentos de ordenamento do território em vigor, dado que "o quadro actual é
muito intrincado e limita a iniciativa". Referia-se José Sócrates, nomeadamente, aos Planos
Directores Municipais e aos Planos de Pormenor, sobre os quais considerou viver-se "uma
situação muito preocupante", pelas esperas por revisão e pela "selva regulamentar" que lhes
preside.

87. A segunda nota situa-se já perto do termo do período de discussão pública e refere-se à
intervenção do Presidente da Associação Nacional dos Municípios Portugueses, na
sessão de abertura da II Conferência sobre o "Ordenamento do Território e Revisão de
PDM´s", realizada na cidade da Covilhã, nos dias 25 e 26 de Outubro do corrente ano.
Nessa ocasião, Fernando Ruas propôs o66:
[...] início a uma reflexão profunda sobre a necessidade de articulação dos diferentes regimes
jurídicos que se sobrepõem, se enleiam, por vezes mesmo se contradizem. Refiro-me à

65
Jornal de Notícias, 18 de Maio de 2006: http://jn.sapo.pt/2006/05/18/nacional/portugal_pensado
_pormenor_para_melho.html
66
Site ANMP: http://www.anmp.pt/anmp/div2006/30a/covilha/doc/intFR.pdf

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Proposta técnica do PNPOT, | Parecer da Ad Urbem

necessidade de articular os regimes de solos, de edificações urbanas, de expropriações e dos


instrumentos de gestão territorial.

88. A Ad Urbem faz suas estas duas orientações/recomendações e apenas acrescenta que, na
preparação da proposta final do PNPOT, as medidas prioritárias que constam do
Programa de Acção sejam apresentadas em moldes idênticos aos adoptados no
Programa Legislativo e de Trabalho da Comissão das Comunidades Europeias67.

Referências

APEA, ASSOCIAÇÃO PORTUGUESA DE ENGENHARIA DO AMBIENTE; ASPEA, ASSOCIAÇÃO PORTUGUESA


DE EDUCAÇÃO AMBIENTAL; GEOTA, GRUPO DE ESTUDOS DE ORDENAMENTO DO TERRITÓRIO E
AMBIENTE; LPN, LIGA PARA A PROTECÇÃO DA NATUREZA; PLATAFORMA TRANSGÉNICOS FORA DO
PRATO; QUERCUS, ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE CONSERVAÇÃO DA NATUREZA; SPEA, SOCIEDADE
PORTUGUESA PARA O ESTUDO DAS AVES (2006), Parecer sobre a Estratégia Nacional de
Desenvolvimento Sustentável (ENDS) e o Plano de Implementação da ENDS (PIENDS).
http://www.apea.pt/files/Parecer_ONG_ENDS_PIENDS_Out06.pdf
COMISSÃO DAS COMUNIDADES EUROPEIAS (2001), Comunicação da Comissão – Simplificar e melhorar
o ambiente regulador. Bruxelas, 5.12.2001, COM (2001) 726 final
http://europa.eu.int/eur-lex/pt/com/cnc/2001/com2001_0726pt01.pdf
COMISSÃO DAS COMUNIDADES EUROPEIAS (2005), Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu,
ao Conselho, ao Comité Económico e Social e ao Comité das Regiões – Aplicar o Programa
Comunitário de Lisboa – Estratégia de simplificação do quadro regulador. Bruxelas, 25.10.2005,
COM (2005) 535.
http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/site/pt/com/2005/com2005_0535pt01.pdf
COMISSÃO DAS COMUNIDADES EUROPEIAS (2005), Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu,
ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões – Libertar todo o
potencial da Europa – Programa legislativo e de trabalho da Comissão para 2006. Bruxelas,
25.10.2005, COM (2005) 531 final: http://ec.europa.eu/atwork/programmes/docs/clwp2006_pt.pdf
COMMISSION OF THE EUROPEAN COMMUNITIES (2006), Communication from the Commission to the
Council, the European Parliament, the European Economic and Social Committee and the Committee
of the Regions – Commission Legislative and Work Programme 2007. Brussels: 24.10.2006, COM
(2006) 629 final
http://ec.europa.eu/atwork/programmes/docs/clwp2007_en.pdf
PRESIDÊNCIA DO CONSELHO DE MINISTROS (2006), Simplex, Programa de Simplificação Administrativa
e Legislativa. Lisboa: Unidade de Coordenação da Modernização Administrativa)
http://www.portugal.gov.pt/NR/rdonlyres/EF50C8AB-7823-45E9-9E0D-
3399777C2888/0/Programa_Simplex.pdf

67
Ver § 35.

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