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Gilles Deleuze, Spinoza et le problème de l’expression. Paris: Les Éditions de Minuit, 1968.

Capítulo XVII
Noções comuns (p. 252-267)

A filosofia de Spinoza não se instala em Deus, nem encontra na idéia de Deus seu ponto de partida
natural. Ao contrário: as condições sob as quais nos temos idéia parecem nos condenar à formação de idéias
inadequadas; as condições sob as quais somos afetados parecem nos condenar a experimentar apenas
afecções passivas. As afecções que preenchem naturalmente nosso poder de ser afetado são paixões que o
reduzem ao mínimo, que nos separam de nossa essência ou de nosso poder de agir.

Paixões alegres e tristes


Mas a distinção radical entre ação e paixão não deve negligenciar uma distinção prévia entre dois
tipos de paixões. Sem dúvida toda paixão nos mantém separados de nossa potência de agir; mas mais ou
menos. Enquanto somos afetados por paixões, não temos a possessão formal de nossa potência de agir. Mas
as paixões alegres nos aproximam desta potência, isto é, a aumentam ou a ajudam; as paixões nos afastam
dela, a diminuem e a impedem.
A primeira questão da Ética é: o que fazer para ser afetado de um máximo de de paixões alegres? A
Natureza não nos favorece a esse respeito. Mas temos que contaro esforço em organizar encontros etc... de
tal modo que sejamos afetados de um máximo de paixões alegres, que convém com a razão etc. Mas não
basta que nossa potência de agir aumente, pois ela poderia aumentar, as paixões alegres poderiam se
encadear indefinidamente e não teríamos ainda a possessão formal de nossa potência de agir. Uma soma de
paixões não faz uma ação. Então isso não basta. É preciso que, em favor desse acúmulo de paixões alegres,
encontremos um meio de conquistar nossa potência de agir para experimentar enfim afecções ativas das
quais nós seríamos a causa. A segunda questão da Ética é: o que fazer para produzir em si afecções ativas?
Se existem afecções ativas, elas são necessariamente afecções de alegria: não há tristeza ativa, visto que toda
tristeza é diminuição de nossa potência de agir etc.(III, 58 e 59).
A alegria ativa é “um outro” sentimento, distinto da alegria passiva (III, 58). Mas Spinoza sugere que a
distinção entre ambos é apenas de razão (o sentimento ativo e o passivo se distinguem como a idéia
adequada e a inadequada. Mas entre uma idéia inadequada e uma idéia adequada de afecção, a distinção é
apenas de razão; V, 3, dem.), pois os dois sentimentos se distinguem somente pela causa; a alegria passiva é
produzida por um objeto que convém conosco, que aumenta nossa potência, mas do qual ainda não temos
uma idéia adequada. A alegria ativa é produzida por nós mesmos, deriva de nossa potência e segue de uma
idéia adequada em nós.
Na medida em que as alegrias passivas aumentam nossa potência de agir, elas convém com a razão. Mas, a
razão sendo potência de agir da mente, as alegrias supostamente ativas nascem da razão. Quando Spinoza
sugere que o que convém com a razão pode também dela nascer, ele quer dizer que toda alegria passiva
pode dar lugar a uma alegria ativa, que dela se distingue somente pela causa (IV, 51, dem.)

Conveniências
Suponhamos que dois corpos convenham inteiramente, isto é, componham todas as suas relações:
eles são como partes de um todo, o todo exerce uma função geral em relação às suas partes, essas partes têm
uma propriedade comum em relação ao todo. Dois corpos que convém inteiramente tem portanto uma
identidade de estrutura. Por comporem todas as suas relações, eles têm uma analogia, similitude ou
comunidade de composição.
Suponhamos agora corpos que convém cada vez menos, ou que são contrários: suas relações
constitutivas não se compõem mais diretamente, mas apresentam tais diferenças que toda semelhança
parece excluída. Entretanto, há ainda similitude ou comunidade de composição, mas de um ponto de vista
mais e mais geral que, no limite, põe em jogo a Natureza inteira. Como todas as relações se compõem na
Natureza inteira, ela apresenta do ponto de vista mais geral uma similitude de composição válida para todos
os corpos. Pois só variam as relações, no conjunto de um universo onde as partes permanecem idênticas.
Aí está o que Spinoza chama de noções comuns. A noção comum é sempre a idéia de uma similitude
de composição entre modos existentes. Mas existem diferentes tipos de noções comuns, mais ou menos úteis,
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mais ou menos fáceis de formar, mais ou menos universais, organizadas de um ponto de vista mais ou
menos geral (II, 40, esc. 1; TTP, cap. 7). Distinguiremos duas grandes espécies de noções comuns: as menos
universais (mas também as mais úteis) são as que representam uma similitude de composição entre corpos
que convém diretamente e de seu próprio ponto de vista. Por exemplo: uma noção comum representa o que
é comum a um corpo humano e à certos corpos exteriores (II, 39; as menos universais). Estas noções comuns
nos fazem compreender as conveniências entre os modos, encontrando na similitude da composição uma
razão interna e necessária da conveniência dos corpos. Num outro pólo, as noções comuns mais universais
representam um similitude ou comunidade de composição, mas entre corpos que convém de um ponto de
vista muito geral, e não de seu próprio ponto de vista. Elas representam isso que é comum a todas as coisas,
como a extensão, movimento e repouso, isto é, a similitude universal nas relações que se compõem ao
infinito do ponto de vista da natureza inteira (E, II, 37; as mais universais). Estas noções comuns têm ainda
sua utilidade, pois fazem conhecer as próprias inconveniências e delas nos dão uma razão interna e
necessária.
Elas nos permitem determinar o ponto de vista a partir do qual cessa a conveniência mais geral entre
dois corpos; elas mostram como e porque a contrariedade aparece quando nos colocamos do ponto de vista
menos universal, isto é, o dos próprios corpos. Podemos, por uma experiência de pensamento, fazer variar
uma relação até o ponto em que o corpo correspondente revista de algum modo uma natureza contrária à
sua; podemos assim compreender a natureza das inconveniências entre os corpos cujas relações são tais e
tais. É por isso que Spinoza, quando assinala o papel de todas as noções comuns tomadas em conjunto, diz
que a mente é determinada do interior a compreender as conveniências entre as coisas, e também as
diferenças e oposições (II, 29, escólio1).

Noções comuns e transcendentais etc.


Spinoza distingue com cuidado as noções comuns dos termos transcendentais (ser, coisa, alguma
coisa), ou as noções universais (gêneros e espécies, Homem, cavalo, cão etc.; II, 40, escólio 1) 2. Mas as noções
comuns são universais, mais ou menos, segundo o grau de generalidade, como se Spinoza atacasse uma
certa concepção do universal abstrato, ou a uma certa determinação abstrata dos gêneros e das espécies. A
idéia abstrata é insuficiente porque retém das coisas diferenças sensíveis e grosseiras: escolhemos um caráter
sensível, fácil de imaginar; distinguimos os objetos que os possuem ou não; identificamos todos aqueles que
os possuem etc. Quanto às pequenas diferenças, as negligenciamos, precisamente porque os objetos se
confundem quando seu número ultrapasssa a capacidade de nossa imaginação. Por outro lado, o caráter
diferencial sensível é extremamente variável por natureza: ele é fortuito, dependendo do modo como os
objetos afetam cada um ao acaso dos encontros (II, 40, escólio 1)3. E a característica retida não varia somente
com cada indivíduo, mas também segundo os objetos que afetam um mesmo indivíduo: uns serão definidos
por sua forma sensível, outros pelo seu uso ou função suposta, outros pela sua maneira de ser etc. De todo
modo, a idéia abstrata é profundamente inadequada, pois é uma imagem que não se explica pela própria
potência do pensar, mas envolve nossa impotência, não indicando a natureza das coisas, mas o estado
variável de nossa constituição (as fluctuatio animi)
Spinoza ataca o senso comum, mas também a tradição de Aristóteles, a biologia aristotélica, onde
aparece o esforço em definir os gêneros e as espécies pelas diferenças, sendo que as diferenças sensíveis são
de natureza muito variável segundo o anumal considerado. Contra isso, Spinoza sugere um princípio:
considerar as estruturas, isto é, o sistema de relações entre as partes de um corpo (essas partes não sendo
orgãos, mas elementos anatômicos desses órgãos), e não mais as formas sensíveis ou as funções.(III, 2
escólio)4. Será investigado como as relações variam em tal ou tal corpo; se determinarão diretamente as
semelhanças etc. A forma e a função de um órgão, num animal determinado, dependem unicamente das
relações entre as partes orgânicas, isto é, entre os elementos anatômicos constantes. No limite, a natureza
inteira é um indivíduo, onde variam as relações entre as partes. O exame das diferenças sensíveis é
substituído pelo exame das similitudes inteligíveis, aptas a nos fazer compreender do interior, as
semelhanças e também as diferenças.

1
Ética, II, proposição 29, escólio.
2
Ética, II, proposição 40, escólio 1
3
Ética, II, proposição 40, escólio 1.
4
Ética, III, proposição 2, escólio.
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As noções comuns são idéias biológicas, mais ainda do que idéias físicas ou matemáticas. Elas
desempenham verdadeiramente o papel de Idéias em uma filosofia da Natureza da qual toda finalidade se
acha excluída5. As noções comuns são idéias gerais, não idéias abstratas. Enquanto idéias, são
necessariamente adequadas.

Noções comuns menos e mais universais


Seja o caso das noções menos universais: o que é comum ao meu corpo e a certos corpos exteriores o
é igualmente em cada um desses corpos; esta idéia é dada em Deus, não apenas enquanto ele tem idéia dos
corpos exteriores, mas também enquanto ele tem simplesmente a idéia de meu corpo; eu a terei a idéia dessa
alguma coisa em comum, tal qual ela é em Deus (II, 39, prop. e dem.).
Quanto às noções mais universais: o que é comum a todas as coisas é igualmente na parte e no todo,
a idéia dela é dada em Deus etc.(II, 38, prop. e dem.)
Essas demonstrações fundam os dois aspectos sob os quais as noções comuns em geral são
necessariamente adequadas. Ou seja, as noções comuns são idéias que se explicam formalmente por nossa
potência de pensar e que, materialmente, exprimem a idéia de Deus como sua causa eficiente. Isto é,
exprimem Deus como causa porque, Deus a possuindo como a possuímos, elas envolvem necessariamente a
essência eterna e infinita de Deus (II, 45, prop. e esc.). Entre as idéias que temos, as únicas que podem
expressar a essência de Deus, ou envolver o conhecimento desta essência, são as idéias que estão em nós
como em Deus: as noções comuns (II, 46, dem.)6. Daí:
Como podemos chegar às idéias adequadas, pois não temos idéias de nós mesmos, nem dos corpos
exteriores, mas somente idéias de afecções, indicando o efeito de um corpo exterior sobre nós. Mas,
precisamente, a partir deste efeito, podemos formar a idéia do que é comum a um corpo exterior e ao nosso.
E esta é a única via que nos conduz a uma idéia adequada. A primeira idéia adequada que temos é a noção
comum, idéia de alguma coisa em comum.
Esta idéia se explica por nossa potência de compreender ou pensar. A potência de compreender é a potência
de pensar da mente. Portanto, somos ativos enquanto formamos noções comuns. A noção comum marca o
momento em que entramos na possessão formal de nossa potência de agir, constituindo o segundo momento
da razão, que em sua gênese é o esforço de organizar encontros em função das conveniências e
inconveniências percebidas. A razão, na sua atividade, é o esforço em fomar noções comuns, compreender
intelectualmente conveniências e inconveniências. Quando formamos uma noção comum, nossa mente se
serve da razão, tornamos racionais.
Uma noção comum é nossa primeira idéia adequada. Mas qualquer que ela seja, ela nos leva imediatamente
à outra idéia adequada, que é expressiva, exprime a essência eterna e infinita de Deus.

Inatismo das noções comuns


Mas como a noção comum vem interromper o encadeamento das idéias inadequadas às quais
parecemos condenados? Comum não significa apenas alguma coisa em comum a dois ou vários corpos, mas
também algo comum aos espíritos capazes de formar uma idéia disso. Mas, de início, Spinoza nos diz que
elas são comuns a todas as mentes (II, 40, escólio 1)7. E mesmo se são assimiladas às idéias inatas, o inatismo
nunca dispensou um esforço de formação, de uma causa fiendi necessária para nos fazer reencontrar o que é
dado apenas de direito. Que as noções comuns sejam em nós como em Deus, significa apenas que, se nós as
formamos, nós as temos como Deus as tem. Mas como as formamos? Em quais circunstâncias?
O problema é insolúvel se permanecermos num ponto de vista especulativo. Dois erros de
interpretação nos parecem perigosos: negligenciar o sentido biológico em proveito do sentido matemático;
mas sobretudo negligenciar ao função prática em proveito do conteúdo especulativo. Este último erro deriva
do modo como o próprio Spinoza introduz o sistema das noções comuns. A Parte II da Ética considera com
efeito essas noções comuns do ponto de vista puramente especulativo; ele as expõe segundo uma ordem
lógica, que vai das mais universais às menos (II, 38 e 39; TTP, cap. 7). Mas Spinoza mostra somente que, se
formamos noções comuns, estas são necessariamente idéias adequadas. A causa e a ordem de sua formação

5
Referência a Geoffroy Saint-Hilaire etc. acentuando a idéia da ausência da finalidade e da recusa ao aristotelismo
etc.
6
Ética, II, proposição 46, demonstração.
7
Ética, II, proposição 40, escólio 1.
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nos escapam ainda, assim como a sua função prática, que se encontra apenas sugerida na Parte II (II, 39,
demonstração).
[...] As primeiras noções comuns que formamos são portanto as menos universais, as que se aplicam
a nosso corpo e a um outro, que convém diretamente com o nosso e que o afeta de alegria. Se consideramos a
ordem de formação das noções comuns, devemos partir delas, pois as mais universais se aplicando a corpos
que são contrários ao nosso, não encontram nenhum princípio indutor nas afecções que experimentam.[...]

Primeiro e segundo momentos da razão


Quando encontramos um corpo que convém com o nosso, quando experimentamos uma afecção passiva
alegre, somos induzidos a formar a idéia do que é comum a este corpo e ao nosso. Por isso Spinoza é
conduzido a reconhecer o privilégio das paixões alegres na formação das noções comuns, na Parte V (10,
demonstração)8. Vemos que basta que o impedimento seja suprimido para que a potência de agir passa ao
ato, e que entremos na possessão do que nós é inato. Por isso não basta acumular paixões alegres para
tornamo-nos ativos. O amor-paixão se encadeia à alegria-paixão, outros sentimentos e desejos se encadeiam
ao amor, todos aumentando nossa potência de agir; mas nunca até o ponto em que nos tornamos ativos. É
preciso que esses sentimentos sejam assegurados; é preciso, de início, evitar as paixões tristes que diminuem
nossa potência de agir; tal é o primeiro esforço da razão.
Mas, em seguida, é preciso sair do simples encadeamento das paixões, mesmo as alegres, pois por
elas não temos ainda uma idéia adequada do objeto que convém em natureza conosco. As paixões alegres
nascem de idéias inadequadas, que só indicam o efeito de um objeto sobre nós. É preciso que, por meio das
paixões alegres, formemos uma idéia do que é comum etc. Tal é o segundo momento da razão. Só então
compreendemos e agimos, somos racionais: não por acumulação de paixões alegres enquanto paixões, mas
por um verdadeiro salto que nos põe em possessão de uma idéia adequada, por meio desta acumulação.
Por que nos tornamos ativos, na medida em que formamos uma noção comum ou temos uma idéia
adequada? A idéia adequada se explica pela nossa potência de compreender, nos colocando na possessão
desta potência, mas como?
Uma idéia adequada é inseparável de um encadeamento de idéias que dela derivam. A mente que
forma uma idéia adequada é causa adequada das idéias que derivam desta, nesse sentido é ativa (III, 1,
demonstração)9.
Quais são as idéias que se seguem da noção comum que formamos por meio, ou favorecidos, por
paixões alegres? Delas decorre uma idéia de afecção, um sentimento que não é mais passivo, mas ativo. Um
sentimento que não é mais paixão, porque deriva de uma idéia adequada em nós etc. Distingue-se portanto
somente pela causa, pois ela não é mais uma idéia inadequada de um objeto que convém conosco, mas a
idéia necessariamente adequada do que é comum ao objeto e a nós mesmos. Por isso Spinoza pode dizer: um
sentimento que é uma paixão cessa de ser uma paixão tão logo nós formamos dele uma idéia clara e
distinta10. Pois dela formamos uma idéia adequada na medida em que a ligamos à noção comum como à sua
causa. Spinoza não quer dizer que toda paixão desapareça, o que desaparece não é alegria passiva, mas
todas as paixões e os desejos que se encadeiam com ela, ligados à idéia da cousa exterior (amor-paixão) (V, 2,
prop. 2 e prop. 4, escólio)11.

Conatus e encadeamento dos momentos da razão.


Um sentimento qualquer determina o conatus a fazer alguma coisa em função de uma idéia de um
objeto; o conatus, assim determinado, se nomeia desejo (III, 9, esc.) 12. Mas enquanto somos determinados por
um sentimento de alegria passiva, nossos desejos são ainda irracionais, pois nascem de idéias inadequadas.
Ora, agora, à alegria passiva se junta um alegria ativa, que dela se distingue somente pela causa; desta
nascem os desejos que pertencem à razão, por que eles procedem de uma idéia adequada (IV, 63, dem. do
cor.)13. Pois todos os desejos e apetites são paixões se nascem de idéias inadequadas, mas não o são quando

8
Ética, V, proposição 10, demonstração.
9
Ética, III, proposição 1, demonstração.
10
Ética, Parte V, proposição 3.
11
Ética, Parte V, proposição 2.
12
Ética, Parte III, proposição 9, escólio.
13
Ética, Parte IV, proposição 63, demonstração do corolário.
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provocados ou engendrados por idéias adequadas, pois os desejos pelos quais somos determinados podem
nascer de ambas etc. (V, prop. 4, escólio)14. Assim, um encadeamento se substitui a um encadeamento
irracional de desejos (V, 10, prop. e dem.)15. Temos então quatro momentos:

A alegria passiva aumenta nossa potência de agir, donde derivam desejos ou paixões, em função de um idéia
ainda inadequada;
Favorecido pelas paixões alegres, formação de uma noção comum (idéia adequada);
Alegria ativa, que segue desta noção comum e que se explica por nossa potência de agir;
Esta alegria ativa se acrescenta à alegria passiva, mas substitui os desejos-paixões que nascem da
passividade por desejos que pertencem à razão, que são verdadeiras ações.

Das tristezas inevitáveis...


Não se trata de suprimir toda paixão, mas por meio da paixão alegre, fazer com que as paixões não
ocupem mais senão a menor parte de nós e nosso poder de ser afetado seja preenchido de um máximo de
afecções ativas (V, 20, escólio)16.
No início da Parte V, Spinoza mostra que um sentimento cessa de ser uma paixão tão logo formamos
dele uma idéia adequada; e nós formamos uma idéia adequada tão logo a ligamos a uma noção comum
como à sua causa. Todavia, Spinoza não reserva esta tese ao sentimento de alegria, ele a afirma válida para
todo sentimento17, pois como diz a demonstração da proposição 4 da Parte V, o que é comum a todas as
coisas não pode conceber-se senão adequadamente e, por consequinte, não há nenhuma afecção do corpo de
que não possamos formar um conceito claro e distinto18.
Tomemos o caso da tristeza, embora Spinoza não queira dizer que a tristeza é comum a todos os
homens ou a todos os seres. Spinoza não esquece que a noção comum é sempre a idéia de alguma coisa
positiva: na é comum por simples impotência ou perfeição (IV, 32)19. Spinoza nos diz que mesmo no caso de
um corpo que não convém com o nosso e nos afeta de tristeza, podemos formar a idéia do que é comum a ele
e ao nosso; simplesmente, esta noção comum será universal, implicando um ponto de vista mais geral do
que o dos corpos que se apresentam. E não tem menos função prática, pois nos faz compreender porque os
dois corpos precisamente não convêm do seu próprio ponto de vista (V, 6, escólio). O homem, com efeito,
compreende que seu próprio corpo e o corpo exterior não teriam podido compor suas relações de modo
durável senão em outras circunstâncias: se os meios tivessem sido dados, pondo em jogo a natureza inteira
etc. Mas quando uma noção comum muito universal nos faz compreender uma inconveniência, ainda nesse
caso um sentimento de alegria deriva daí: sempre uma alegria ativa segue do que compreendemos (V, 18,
escólio). Parece que, mesmo se partimos de uma paixão triste, o essencial do esquema precedente é
encontrado: tristeza; formação de uma noção comum; alegria ativa que daí deriva.
Na Parte II, Spinoza considera as noções comuns em seu conteúdo especulativo; ele as supõem
dadas, ou pondendo se dar. É normal que se vá das mais às menos universais, seguindo uma ordem lógica.
Na Parte V é analisada a função práticas das noções comuns supostamente dadas: função que consiste em
que a noção comum é causa de uma idéia adequada de afecção, ou alegria ativa. Esta tese é válida tanto para
as noções comuns mais universais como para as menos etc., tomadas conjuntamente na sua função prática.
Mas tudo muda quando Spinoza pergunta, na Parte V, como chegamos a formar uma noção comum.
Vemos então que as primeiras noções comuns são, necessariamente, as menos universais, as que se aplicam a
meu corpo e a um outro que convém com ele (ou alguns outros corpos); elas só encontram nas alegrias
passivas que experimento a ocasião de serem formadas.
As mais universais, ao contrário, se aplicam a todos os corpos; se aplicam a corpos muito diferentes,
contrários uns aos outros. Mas a tristeza, o a contrariedade, produzida em nós por um corpo que não
convém com o nosso, nunca é a ocasião de formar uma noção comum.

14
Ética, Parte V, proposição 4, escólio.
15
Ética, Parte V, proposição 10.
16
Ética, Parte V, proposição 20, escólio. (é o escólio que fala, entre outras coisas, dos remédios para os afetos e da
vida presente..., passando então ao que diz respeito à duração da mente sem relação com o corpo...)
17
Parte V, proposição 4.
18
Parte V, proposição 4, demonstração.
19
Ética, Parte IV, proposição 32.
Gilles Deleuze, Spinoza et le problème de l’expression. Paris: Les Éditions de Minuit, 1968. Capítulo XVII Noções comuns 6

De modo que o processo de formação das noções comuns se apresenta assim:


Procuramos experimentar um máximo de paixões alegres (primeiro esforço da razão); procuramos evitar as
paixões tristes, escapar a seu encadeamento, conjurar encontros nocivos.
Depois, nos servimos das paixões alegres para formar a noção comum correspondente, donde derivam
alegrias ativas (segundo esforço da razão); tal noção comum está entre as menos universais, visto que se
aplica somente a meu corpo e a corpos que convém com ele. Mas ela nos torna mais fortes para evitar os
encontros nocivos; e sobretudo nos põe em possessão de nossa potência de compreender e agir.
Então, tornamo-nos capazes de formar noções comuns mais universais, que se aplicam a todos os casos,
mesmo aos corpos que nos são contrários; capazes de compreender mesmo nossas tristezas e de extrair dessa
compreensão uma alegria ativa. Somos capazes de enfrentar os encontros nocivos que não podemos evitar,
reduzir as tristezas que subsistem necessariamente em nós. Mas não esqueçamos que, apesar da identidade
genérica de sua função prática (produzir alegrias ativas), as noções comuns são tão mais úteis, mais eficazes,
quanto procederem de paixões alegres são menos universais (V, 10)20. Devemos selecionar nossas paixões, e
mesmo quando encontramos alguma coisa que não convém conosco, esforçarmo-nos por reduzir a tristeza
ao mínimo. Quando formamos as primeiras noções comuns, somos tanto mais fortes para evitar os maus
encontros e os sentimentos que nos são contrários (V, 10, escólio).
Todas as noções comuns têm um mesmo conteúdo especulativo: implicam uma certa generalidade
sem abstração. Elas têm uma mesma função prática: idéias necessariamente adequadas, são tais que delas
derivam alegrias ativas. Mas seu papel, especulativo e prático, não é o mesmo se consideramos as condições
de sua formação.
As primeiras são as menos universais, porque encontram nas paixões alegres um princípio indutor
eficaz. É no nível do menos universal que conquistamos nossa potência de agir, acumulamos alegrias
passivas, encontrando a ocasião de formar idéias adequadas, alegrias ativas. Nesse sentido, o aumento da
potência de agir nos dá ocasião de conquistar esta potência, ou de um devir ativo efetivo. Tendo conquistado
nossa atividade sobre certos pontos, tornamo-nos capazes de formar noções comuns, mesmo nos casos
menos favoráveis. Há toda uma aprendizagem das noções comuns, não se devendo negligenciar o problema
de seu processo de formação; é preciso partir das noções comuns as menos universais, as primeiras que
temos ocasião de formar.

20
Ética, V, proposição 10.

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