THIAGO BERNARDES
De Curitiba
A certeza da vida futura não exclui as apreensões do homem quanto à desencarnação. Há muitos
que temem não propriamente a vida futura, mas o momento da morte. Será ele doloroso? Tentando
elucidar essas questões, Kardec inquiriu os Espíritos e deles recebeu a informação de que o corpo quase
sempre sofre mais durante a vida do que no momento da morte e que os sofrimentos que algumas vezes
se experimentam no instante da morte são um gozo para o Espírito.
É preciso, no entanto, que consideremos que a desencarnação não é igual para todos e que, ao
contrário, há uma variação muito grande, tão grande quanto as diferentes formas de viver adotadas pelos
encarnados. Vendo-se a calma de alguns moribundos e as convulsões terríveis de outros, pode-se
previamente julgar que as sensações experimentadas nem sempre são as mesmas.
A separação da alma é feita de forma gradual, pois o Espírito se desprende pouco a pouco dos laços
que o prendem, de forma que as condições de encarnado ou desencarnado, no momento do desenlace, se
confundem e se tocam, sem que haja uma linha divisória entre as duas.
Alguns fatores podem influir para que o desprendimento ocorra com maior ou menor facilidade,
fatores que estão relacionados com o estado moral do homem quando encarnado. A afinidade entre o
corpo e o perispírito é proporcional ao apego do indivíduo à matéria, que atinge o seu ponto máximo no
homem cujas preocupações dizem respeito exclusivamente à vida de gozos materiais. Ao contrário
disso, nas almas puras – que antecipadamente se identificam com a vida espiritual – o apego é quase
nulo.
Em se tratando de morte natural resultante da extinção das forças vitais por velhice ou enfermidade,
o desprendimento opera-se gradualmente. Para o homem cuja alma se desmaterializou e cujos
pensamentos se destacam das coisas terrenas, o desprendimento quase se completa antes da morte real,
ou seja, tendo o corpo ainda vida orgânica, o Espírito já começa a penetrar a vida espiritual, apenas
ligado à matéria por elo tão frágil que se rompe com a última pancada do coração.
No homem materializado e sensual, que mais viveu do corpo que do Espírito, e para quem a vida
espiritual nada significa, tudo contribui para estreitar os laços materiais e, quando a morte se aproxima,
o desprendimento, embora também se opere gradualmente, demanda contínuos esforços. As convulsões
da agonia são indícios da luta do Espírito, que às vezes procura romper os elos resistentes, e outras vezes
se agarra ao corpo, do qual uma força irresistível o arrebata com violência, molécula por molécula.
O desconhecimento da vida espiritual faz com que o Espírito se apegue à vida material, estreitando
os seus horizontes e resistindo com todas as forças, conseguindo prolongar a vida e, conseqüentemente,
a sua agonia, por dias, semanas ou meses. Em tais casos, a morte não implica o fim da agonia, pois a
perturbação continua e ele, sentindo que vive, sem saber definir seu estado, sente e se ressente da doença
que pôs fim aos seus dias, permanecendo com essa impressão indefinidamente, uma vez que continua
ligado à matéria por meio de pontos de contato do perispírito com o corpo.
Dá-se o contrário com o homem que se espiritualizou durante a vida. Depois da morte, nem uma só
reação o afeta. Seu despertar na vida espiritual é como quem desperta de um sono tranqüilo, lépido, para
iniciar uma nova fase de sua vida.