'(,,,m,ç,,
mensagem sinal sinal recebido mensagem
D Nosso próximo passo será, assim, o de verificar de que modo os estudos da lillgua
gem procuraram vencer as limitações apontadas dos esquemas e modelos da teoria da ill
formação. Dois caminhos têm sido seguidos: o de procurar, de alguma forma, compk,tal
ou complementar as propostas excessivamente simplificadoras de comunicação; o (k n',
ver, de um outro ponto de vista, a questão da comunicação, sobretudo em relação aos a~
pectos criticados do caráter linear e mecanicista dos modelos anteriores propostos,
fonte de ruído
3, Simplificação e "complementação":
O esquema da comunicação comporta assim um emissor e um receptor, divididos as propostas de B, Malmberg e R. Jakobson
l'm duas ou mais caixas (há propostas com subdivisão maior), que separam a codificação
l' a dccodificação da emissão e da recepção propriamente ditas, um canal, isto é, um Bertil Malmberg (1969) e Roman Jakobson (1969), entre outros lingllistas ou h'\I
suportc matcrial ou sensorial que serve para a transmissão da mensagem de um ponto ao ricos da informação, fazcm parle do primciro grupo. Suas propostas, dc algumll 1111'1111
oulro, e uma mCllsagcm, rcsultante da codificação e entendida, no momcnto da trallsmis. procuraram "complelar" ou "ampliar", para que pudesse scr usado para a COllIUlIll'UÇI\O
NAo,('01110unlll seqnêllcia de sinais. Antcs da transmissão da mcnsagcm sitUUll1,Sl'11'1
Opl' Vl'rhal, o IlIodl'lo dl' l'OIlUlllil'uc,no1'X('('ssivunll'lIll'sill1plilkmlo dall'oria du illrofllw~'I\o,
26 Introdu<,;óo a lInoülsllcu A comunlcoçóo humcmo ?9
canal fisico e uma conexão psicológica entre o remetente e o destinatário, que os capacitem ~'8~
u"
fientrar e a permanecer em comunicação. O esquema que segue permite visualizar, mas sem
muitos detalhes, a proposta de Jakobson (1969: 123).
CONTEXTO ~
o .., B "
.ia J< :
. //::=:::..\\
MENSAGEM E
ImMbTENTE DESTINATÁRIO
~~.=
.~ ._;á
;;;c... . :I
.E.!!
;:I:I " Jjl:
CONTACTO :( :::
CÓDIGO
I
JOSS!W:)olpfn~
Ignfteio Assis Silva (1972) propõe, por sua vez, uma representação mais detalhada
do l~s~l"cmllde Jakobson (p, 30). retomando os elementos da teoria da informação não
l'xplicitndos por ele,
A comunlcoçao humano 31
30 Introduçõoà lingülsllca
~
::i:
r (1976), ao comparar a comunicação das abelhas com a linguagem dos homens, conclui qu~ II!I
1
: i abelhas não têm linguagem, mas apenas um código de sinais, pois não há, entre as abclha!!.
..
o ! g,. i diálogo, retransmissão de informação, metalinguagem, outros dados, além dos de alimenlaç~o.
i>.
"" .g.- ~ B!
i '":s '", ! articulação, que são características fundamentais da comunicação entre seres humanos.
'".. ' -o I
I
!~ I- I .
ao
Para que haja comunicação é preciso um código parcialmente ou totalmente comum
e ao destinatário. Umberto Eco (1974) prevê uma caixa para o código. 1111
remetente
;i
..
p
r=
11)
.
.....................-...-..-..-.....-
'""
'S
::J
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I ~i
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L
B . (J
E
<.: i
"
J
comunicação entre máquinas, e aponta a necessidade de caixas diferentes para códigos ~.
subcódigos, tal como explicitado por Assis Silva, no modelo ?e Jakobson.
Os subcódigos, dessa forma, introduzem no esquema da comunicação a qucslllo dll
variação lingüística, examinada, de diferentes perspectivas, pela sociolingüística, pela
dialetologia ou pela geografia lingüística.
Códigos diferentes impedem a comunicação (a não ser que ela se estabeleça por
§ '..
:s
E
O .!! c
8 outro código,que nãoo verbal,por exemplo,comoocorrena comunicaçãogestualcnlrl'
E .;;; é" o
[
~o~ ... Ob falantes de línguas diferentes). Assim, não houve comunicação entre uma turista brasileirn
:i i
" E"
.... .:1
.g
:;
~ g'g .. ~ e o garçom de um restaurante, em Buenos Aires, pelo fato de não falarem a mesma IingulI.
I I
'" ::i: ;g
~ de não usarem o mesmo código. Ao perguntar ao garçom qual era a especialidade da cIIsa.
I a turista foi encaminhada ao banheiro, pois o garçom, que não falava ou entendia portuguê!l.
õI
c" ; i
U interpretou a questão no quadro das perguntas mais usuais sobre a localização do banheiro
J
.. ..................................!
o
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'§ :.a cc
I
i do restaurante. Mas também a pouca intersecção de subcódigos dificulta bastanlc a
'E '" '8 8!
"i;) i comunicação. Duas histórias com portugueses ilustram a questão. Ao ouvir de professol'l1R
8.:e"i
'" g" :g ! universitários portugueses, em um congresso na Espanha, que tinham feito a viagem dI'
Portugal à Espanha de caminhonete, um brasileiro surpreendeu-se muito, até saber qut',
, o..
ri:
c'"
" '" .
I ~
o
=a
j i
.
naquele subcódigo, caminhonete é o mesmo que ônibus. Outro "caso" é de uma estudllnt~.
brasileira na Europa, com pouco dinheiro, como em geral acontece com estudantcs no
EJ
~'Ê ã::s ~ i
~
cxterior, que, em um hotel em Lisboa, tendo sujado a pouca roupa que levara, n1'l0Il'V('
outro jeito senão deixar um bilhete à camareira, pedindo-lhe que mandasse lavar, eom
L ~ 1
urgência, sua camisa branca, e que teve, ao voltar ao hotel, a triste surpresa de enconll'lu
'"<J tU g eB sua velha camisola (camisa, no subcódigo de Portugal) bem lavada e passada,c a CIIII1I!1U
" ~ E!: ~.~
-.;
u a o :::f~::s
::i: <J.5 g de que precisava, ainda suja e amassada. E ainda teve que pagar por isso. Em olltra!l
~ palavras, quanto maior for a intersecção entre os subcódigos do remetente e do destinlltóno.
mais bem-sucedida será a comunicação.
" Uma segunda questão, nem sempre bem explicitada no exame da comunicllçl\o ('
;:
If relacionadacom a questão do código, é a da valoraçãodos diferentescódigos c subcódigos t'
du visllo quc o usuário lem da sua lingua c das variantes que usa. Bons cxcmplos, cm rclt",.no
I\Sdiferl'nçlls de código e às vislks qUl' dele lêm seus usuários, podcm ser cnconlrudo!ll\ll!l
32 Inlroduc;oo (I Lln\Jül~lIuJ
A ( on 11JI1h :nc,:O() IInUII',II. <I :n
é 11Cllru
Roca .... b o .... 0 é 11clllru du vovô.
,
OAA.CNlO~A. O~~I!IIMOU Mlls fiquei
l.MNíQJI;I..~ pAA/\O bluqueada
'JUIO~~ PIZ5M~ONPPA
MA\.lF"""",,~ ~ Q.bWTOMA15
MA/SPOGP I'IJNT~! ~~~s... c agura
de noile
só sonho
gemada (Chico Buarque, "A galinha")
o texto acima tem, como função predominante, a função poética, mas também apreSl'lItll
função emotiva, graças aos procedimentos de Ia pessoa (que eu choco) e à apresentaçll0 dl'
sentimentos e emoções (me toco, fiquei bloqueada), que produzem os efeitos de SUhjl'llVI
dade, de emotividade ou de aproximação do sujeito, próprios da função emotiva.
b) L2 e:: e:: e Ponteio é uma música maravilhosa aliás uma coisa
[
LI
( ) música maravilhosa...
L2
linda ... ( ) mesmo tempo que foram
[
LI pois é mas aí não há...
L2 premiadas as duas não é?
LI
aí a Marília então... ahn... eh cantou lindamente... e
mais do que cantar eu acho que a Marília tem uma força
dramática muito grande o que faz (com) que se suponha
nela... uma atriz dramática que não foi aproveitada... (Castilho e Prcti, 19H7:24H)
exemplo, o entrevistador (Doc), depois das perguntas iniciais, participa do diálogo mais 36
vezes: em dezenove faz apenas "uhn uhn", em uma diz "isso..." e em outra, "certo". Os
textos abaixo exemplificam as perguntas repetidas, mesmo quando já respondidas:
a) Doc - e o que você costuma comer em cada uma dessas refeições'! (Preti e Urbano, ]988: 120)
Doc - come em casa... e no café da manhã o que você come'! (Preti e Urbano, 1988: 121)
I
A primcira perguntajá foi feita após o entrevistado tcr explicado () 1111\' ('(ullia L'm
o.. pro81dllnlflll lornlH1do I-IflnrlqulI Cnrdo!lo 11GflorljO W, BUilh 80 cumprlmflnlAm no 8111110OVAl dI!
(;'UIII Brnll<:ll, no!! [!lIndo!! Unldofl
L'ada rL'fL'içl1o. Essas pL'rgUt1(as têm assim a ftllH,'ão dL' manlL'r o L'ntn'vi!'lllltlol'llulldo
38 Introdução 6 Llngülstlca A cornur,I" I<JU) t1lJrI1!1I1<I ~w
geral no presente do indicativo, em orações predicativas de definição (x é y). O efeito de particularmenh: o alo dI' /ingllag<'/II com a condiçfto de quc n sujeiln IIltlllali~.adnl ~,'ja
sentido é o de linguagem que fala de linguagem, ou seja, de circularidade da definição e da sulicicnlemcnte determinado, é o lugar do surgimcnto das modalidades" (Oreimns, 1976: ~7)
comunicação. Não se deve confundir a função metalingüística de Jakobson com a metalin-
d) Compõe-se a palavra de syllabas, como V.g. a palavra Livro, que sc compõe de duas syllahaN, 1)111'
guagem científica. Metalinguagem científica e função metalingüística ordinária caracteri- sftn li. e vro.
zam-se ambas como uma linguagem definidora de outra linguagem, ou seja, como uma lin- A syllaba é a eomprehensão de um som perfcito, que sc pronuncia com um só espfritn. nu a"l'l'lIln,
guagem que fala de outra linguagem. Diferenciam-se, porém, pelo fato de a metalinguagem cnmn na sobredita palavra livro, tanto li, como vro é syllaba. porque eada um dclles lil~ UIII ~nlll
científica ser, por sua vez, definida por outra, uma terceira linguagem, a metalinguagem perfeito, que se profere com um só espírito, ou accento. (Lobato, 1837).
metodológica, o que não acontece com a função metalingüística ordinária. Assim, a função
metalingüística produz o efeito de circularidade (de uma linguagem que define outra lin- Os textos a e b apresentam função metalingüística. No texto, discute-se uma dclil\l~~n(l
guagem) e a metalinguagem científica produz a ilusão de superposição de níveis (de uma dc educação dada principalmente pela definição de dois campos semânticos para a puluvl'll
linguagem que define outra linguagem e é, por sua vez, definida por uma terceira). Os tex- educação, um de escola, livro novo, caderno, caneta, professor fino, recursos, outro di'
tos que seguem ilustram a função metalingüística e a metalinguagem científica. l'scolinha cai-não-cai, professorinha, enxada, saberzinho. A linguagem está discutindo u
IlI1guagem e os sentidos das palavras que variam, conforme varia a inserção sociul do~
(a) ... Agora, o senhor chega e pergunta: "Ciço, o que que é educação?" Tá certo. Tá bom. O que talantes, questão de que trataremos mais à frente. No texto (b), usa-se também a linguRgl~111
que eu penso, eu digo. Então veja, o senhor fala: "Educação"; daí eu falo: "educação". A palavra é pura làlar da linguagem, tanto do plano do conteúdo (carbúnulo, etc), quanto do da cxprcssnl I
a mesma, não é? A pronúncia, eu quero dizer. É uma só: "Educação". Mas enlão eu pergunto pro (l'Om z, com x, com th). Os dois casos são de função metalingüística, mas não de metalinguugl~111
senhor: "É a mesma coisa? é o do mesmo que a gente fala quando diz essa palavra?" aí eu digo:
l'lcntífica (embora no exemplo b possa haver alguma dúvida).
"Não". Eu digo pro senhor desse jeito: "Não, não é". Eu penso que não.
Educação... quando o senhor chega e diz "educação", vem do seu mundo, o mesmo, um outro. Já os textos c e d ilustram uma metalinguagem científica, a da Semiótica ou u dll
Quando eu sou quem fala vem dum outro lugar, de um outro mundo. Vem dum fundo de oco I.ingüística. No texto c define-se, metalingüisticamente, modalidade e ato de linguage",.
que é o lugar da vida dum pobre, como tem gente que diz. Comparação, no seu cssa palavra Icrmos que, por sua vez, já pertencem a uma metalinguagem, pois podemos dizer qUI' OM
vem junto com quê? Com escola, não vem? Com aquele professor fino, de roupa boa, estuda- Il'rmos dever e querer, da língua portuguesa (l0 nível de linguagem) são modalidadcs (.'''
do; livro novo, bom, caderno, caneta, tudo muito separado, cada coisa do seu jeito, como deve
ser. Um estudo que cresce e que vai muito longe de um saberLinho só de alfabeto, uma conta
nível de linguagem) e modalidade, por sua vez, deve ser entendida tal como no texto citlldo
aqui e outra ali. Do seu mundo vem um estudo de escola que muda gente em doutor. É fato? ( \" nível de linguagem). É essa superposição de níveis que caracteriza a metalinguugl'tll
Penso que é, mas eu penso de longe, porque eu nunca vi isso por aqui. l'lcntífica.
Então, quando o senhor vem e fala a pronúncia "educação", na sua educação tem disso. Quando o No texto d, como se observa, ao dizer que li e vro são sílabas faz-se metalinguugl'lII.
senhor Falaa palavm conforme eu sei pronunciar também, ela vem misturada no pensamento com ou seja, explica-se a língua portuguesa (Ii-vro) com uma metalíngua (sílaba), e ao dizcr qUI'
isso tudo; recursos que no seu mundo tem. Uma coisa assim como aquilo que a gente conversava
outro dia, lembra? Dos evangelhos: "Semente que cai na terra boa e deu fruto' bom". (...)
.l'ílaha é a compreensão de um som perfeito, faz-se metametalinguagem, isto é, explieu ,!Irti
Quando eu falo o pensamento vem dum outro mundo. Um que pode até ser vizinho do seu, vi- IIIctalíngua (sílaba) com uma metametalíngua (compreensão de um som perfeito). TcnloSl'ul,
zinho assim, de confrontante, mas não é o mesmo. A escolinha cai-não-cai ali num canto da portanto, uma metalinguagem científica.
roça, a professorinha dali mesmo, os recursos tudo como é o resto da regra de pobre. Estudo? Finalmente, os textos com função poética empregam procedimentos no pluno du
Um ano, dois, nem três. Comigo não foi nem três. Então eu digo "educação" e penso "enxa- l~xprcssão, sobretudo as diferentes formas de reiteração de sons (traços dos fonemas, sflahuN..
da", o que foi pra mim. (Sousa, 1984)
1'11mos, entoações, etc). Jakobson diz que afunção poética projeta oprincípio de eqlliva/c'm'/tI
(b) O Professor Sampaio ensina ao ministro da Saúde que "em português, antraz é a denomina- do eixo de seleção sobre o eixo de combinação. (1969: 130). Em outras palavras, a flll1~'l1o
ção para um aglomerado de furúnculos, infecção estafilocócica relativamente freqüente. Em poética resulta de duas rupturas, de duas subversões: a primeira, em relação ao plano dll
inglês, "anthrax" designa uma infecção em animais, mas que atinge o homem, grave e even-
expressão, que, em lugar de apenas expressar, "transparentemente", o conteúdo, Chl1llllt11
tualmente fatal, cuja tradução para o português é carbúncu!o. Em espanhol, "carbunco", em
francês, "charbon", em alemão, "milzbrandkarbunkel". Quanto a Rey, Sampaio sugere que ulenção enquanto expressão "opaca", como sonoridade, ritmo, entoação; a segundll. 1'111
consulte obras especializadas, como o Dicionário de Termos Técnicos de Da/amare, "cujo pre- rl'lação aos dois eixos de organização da linguagem, o paradigmático e o sintagmático, dclinido~,
fácio é de Carlos Chagas, glória da medicina brasileira e da Fiocruz, para saber a diferença en- respectivamente, como eixo das similaridades, em que se faz a seleção, e como eixo dll"
tre antraz e carbúnculo".
l'ontigllidades, em que se opera a combinação, pois o texto com função poética vai eomhinllr.
O que o professor Sampaio está dizendo, para tranqüilizar pessoas que já foram vítimas do an-
traz no Brasil, é que essa doença, mais amena e Freqüente, não pode ser confundida com car-
no sintagma, elementos similares, próprios do paradigma. Os efeitos de sentido sí'lo,porllll1l0.
búnculo (anthrax, em inglês), "uma infecção em animais que atinge o homem de forma grave li de eoisa extraordinária, de novidade, graças à ruptura ou subversão da "normalidatk o 11('
e eventualmente fatal". Sampaio demonstra que tanto o clássico Candido de Figueiredo, como cslcsia ou de perfeição, decorrente da superposição dos dois eixos de funcionlll1lcl1to dll
outros dicionários (Aurélio e Houaiss) se equivocaram e uns teriam reproduzido o erro de ou- IlIIguugem c da aproximação entre expressão e eonteÚdo; o de continuidade ou de npngunll'nlo
tros (Ulisses Capozoli, Nós e os outros na guerra bacteriológica. Texto recebido pela inlerr1l'I), dus dil~rcnçns, tnnlo entre sintagmll c puradigmu, quanto entre expressí'lo e eonteÚdo,
(c) Se se toma como ponto de partida a definição provisória da modalização, seglllldo u I(lIul"NIII Jukohson insiste, ('om rnzllo, 1'111
qUI' runç/lo poélku n/lo 0('01'1'1'npl'nllS nu plll'~ill.
seria "uma modificação do predicado pelo sujeiln (I), pode-se cOllsidernr 11"" (\ "'" ,. 111111-