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Bibliotecário do Instituto de Geociências da USP, formado pela Escola de Comunicações e Artes –
ECA/USP.
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os mortos se comunicam, levantam de suas tumbas, perambulam pelos locais à
vontade, sem restrição, barreiras, pintam o sete e depois voltam para suas
covas... bendito imaginário popular, com suas inspirações de liberdade e
criatividade! Na biblioteca, o silêncio é imposto ao ser vivo, cultural e dinâmico.
Relações plenas de interação social são bloqueadas em detrimento de regras e
convenções sociais. No cemitério e no necrotério, o cidadão desprovido de vida
biológica, não é condicionado ao comportamento uniforme, como acontece em
muitas bibliotecas, nas quais as práticas dialógicas, plurissignificativas e
heterogêneas são obstruídas; naqueles espaços fúnebres, o silêncio é o resultado
natural de um ciclo vital concluído, sem imposições e convenções ultrapassadas e
muitas vezes egocêntricas. O silêncio do cemitério e do necrotério é nobre. O
silêncio e o bloqueio aos processos de comunicação em muitas bibliotecas são
deprimentes, patéticos. A vida é polissêmica. A ação discursiva humana é
heterogênea e deve ganhar liberdade de expressão e criação em toda a sua
potencialidade, em todos os ambientes sociais comprometidos com a construção
democrática do conceito e da prática de cidadania plena.
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seu cultural num canal fechado por padrões e condutas homogêneas, colocando o
cidadão na esfera “reto-anal” da sociedade, como um mero espectador e receptor
passivo de significados e objetos simbólicos criados e produzidos por agentes
sociais que dominam, mesmo na sua minoria, as grandes massas agrupadas
socioeconomicamente: desigualdade social. Independente da sua condição social,
as pessoas morrem, calam-se e, democraticamente, do ponto de vista biológico,
cessa o embate, o conflito cultural (a menos que o cidadão tenha expressado suas
idéias e conceitos, registrando-os em canais formais de comunicação para a
eternidade, mantendo o seu discurso, de acordo com a pertinência, vivo e latente).
É lamentável que possa haver uma relação social, uma analogia negativa, no
imaginário popular, entre a biblioteca, o necrotério e o cemitério, ligadas ao
comportamento do cidadão, na sua impossibilidade de se comunicar e criar
situações de ruptura, conflitos. As bibliotecas que praticam tais ações, no Brasil
contemporâneo, não têm o direito de isolar os cidadãos em jazigos bibliotecários
grupais ou individuais de silêncio e total falta de interação social.
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criar, o sentimento de um crescimento interior, em que nos
ampliamos em nossa abertura para a vida.
REFERÊNCIAS
MILANESI, Luís. A casa da invenção. 4. ed. São Paulo: Ateliê Editorial, 2003.
OSTROWER, Fayga. Criatividade e processo de criação. 4. ed. Petrópolis:
Vozes, 1984.