(PPGB – Univás) Breve história do feminismo O que é Gênero?
É um conceito/categoria das ciências sociais,
elaborado no interior do pensamento feminista, que diz respeito às diferenças socialmente atribuídas ao feminino e ao masculino, cujas marcas se inscrevem, sobretudo, nos corpos das pessoas. As marcas de gênero se intersectam a outras marcas - raciais, étnicas, de classe, de idade, de orientação sexual, etc. – produzindo hierarquias, ou seja, relações sociais assimétricas e desiguais em termos de poder. Sexo e gênero em Simone de Bouvoir Para que serve?
Gênero oferece a possibilidade de um outro olhar
sobre a realidade, permitindo ler como as desigualdades afetam, de modos distintos, homens e mulheres nas suas relações uns com os outros: homens-homens; homens-mulheres; mulheres- mulheres. Possibilita analisar como operam as hierarquias e qual a centralidade que as outras marcas assumem. Marcas de diferença
Marcas de gênero, classe, raça, orientação sexual,
etc., não são equivalentes. Quando hierarquizadas, as marcas de gênero tendem a se fixar no pólo mais “fraco” da balança, por ser a forma mais antiga e naturalizada de distinção entre pessoas, coisas e fenômenos. Na “balança” de gênero, o feminino e, por consequência, as mulheres, ocupam as posições mais vulneráveis. Todas as culturas conhecidas apresentam sistemas de gênero específicos, resultando em desigualdades aparentemente “universais”. Por isso, algumas diferenças tendem a ser consideradas “naturais”. No entanto, a noção de gênero, tanto quanto a de sexo, são construídas socialmente. Por isso, a fórmula Sexo = natureza/ Gênero = cultura precisa ser problematizada. Matriz heterossexual
Gênero permite analisar como opera a “matriz
heterossexual”, por meio de uma série de coerências do tipo: • Mulher = Feminilidade = Passividade = Desejo por homens • Homem = Masculinidade = Agressividade = Desejo por mulheres.
Uma vez naturalizado, o Gênero tende a coincidir
com sexo biológico ou “papéis sexuais”; cada pessoa, definida pelo seu sexo, possui determinadas funções a cumprir, dando origem a “tipos sociológicos”. • Essas posições, uma vez naturalizadas, dão forma às instituições e práticas sociais: família, ciência, religião, política, escola, arte, etc. • Gênero permite desconstruir regras rígidas e aparentemente fixas em todos esses campos, embora todas as mudanças sociais levem um tempo considerável. • Consiste numa ferramenta importante no mundo da ação política e da intervenção social. Pensar com “lentes de gênero” é aprender a interrogar cotidianamente sobre os efeitos de poder nas relações e práticas sociais diversas. Sendo construções sociais e arbitrárias, podem ser modificadas. Portanto, gênero é, sobretudo, um conceito político, uma ferramenta de transformação das relações sociais. O feminismo negro: Novos desafios para o “sujeito do feminismo”. Gênero e performatividade QUEER: Uma teoria deslocada A teoria queer surgiu como argumento político e contestatório ao movimento assimilacionista de gays e lésbicas norte-americano, mas, sobretudo de gays, aos impactos sociais da AIDS. O que começou como uma discussão interna no movimento, foi sendo sistematizado em linhas argumentativas que geraram um importante cabedal conceitual e teórico que desestabilizou a ideia de estudos de “minorias” e da sexualidade como um aspecto tangencial das dinâmicas sociais. As políticas de liberação gay conseguiram o reconhecimento de certos direitos civis e também ganharam visibilidade no mercado econômico. Houve certamente um avanço nas problematizações, mas o caráter naturalizador e essencialista ainda estava presente, além de que muitas comunidades gays começaram a criticar condutas sexuais e políticas que fugiam da normalidade. Algumas críticas foram feitas, além do caráter naturalizador e essencialista, aos grupos de gays, lésbicas e feministas, pois dentro dos mesmos as problematizações e enfrentamentos se baseavam nas realidades de sujeito(a)s da classe média e branca, assim deixando de lado questões relacionadas à raça/cor, classe social, desejos e práticas sexuais, ou seja, as problematizações eram realizadas em cima de sujeito(a)s que de alguma forma estavam na “norma” e muito(a)s eram esquecido(a)s. • Outro fator importante, para o surgimento do movimento Queer, foi o aparecimento da Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (SIDA ou em inglês – Acquired Immunodeficiency Syndrome – AIDS);
• Com a crise da AIDS, crise do movimento feminista
heterocentrado e branco, entre outros fatores surgem as Políticas Queer que problematizavam os discursos identitários, que em suas bases eram e são excludentes e assim se contrapondo aos regimes normativos. Quando os estudos queer chegaram ao Brasil não entraram pela via das demandas e debates dos movimentos sociais, como nos Estados Unidos, mas pelas portas da academia. Chegaram aqui por meio da literatura dura e desafiante de Judith Butler. Os estudos queer começam a ser referenciados no Brasil no mesmo momento no qual experimentávamos o fortalecimento de políticas identitárias, entres estas estavam aquelas articuladas pelo então movimento GLBT (gays, lésbicas, bissexuais, travestis e transexuais). De maneira que uma teoria que se proclamava como não-identitária parecia potencialmente despolitizante. Não tardou para que algumas lideranças do movimento LBGT brasileiro, muitas delas formadas na militância da luta contra a aids, se pronunciassem contra “os queer”. Estávamos desafiando os limites normativos das identidades que haviam servido, até então, como mote para demanda de direitos. O queer, como pensamento crítico, se propõe justamente a desafiar as identidades, não por niilismo, e sim a fim de promover uma profunda revisão teórica e política. Questionando não os sujeitos que “encarnam” identidades, mas a ordem social e cultural que as constituí como aceitáveis e normais ou abjetas e patológicas. Trata-se, portanto, de operar a partir da desconstrução como método capaz de nos dar pistas de como alguns discursos chegam a instituir verdades sobre comportamentos, corpos, pessoas, instituições; Algumas definições Bixa Travesti Experiências de (des) construções do corpo trans A sexualidade foi e ainda tem sido vinculada com a natureza, de tal modo que é utilizada como base legitimadora da ordem social, da produção das diferenças e desigualdades, sendo o apoio dos discursos proferidos pelo(a)s dominantes (classe média e alta, heterossexuais, branco(a)s, homens), pois estabelecem normas para dominarem. Partindo desse pressuposto, Gayle Rubin (1989) afirma que o sexo foi ao longo dos tempos sendo reprimido e construído como uma prática pecaminosa, quando existem variações (quando vai além do sexo reprodutivo), principalmente pelas instituições religiosas cristãs e mais tarde pela medicina, psiquiatria e psicologia, que patologizaram essas práticas sexuais que fogem do sexo para procriação em sua vertente “tradicional”. • Sendo assim, é fundamental para a perspectiva Queer a desnaturalização das sexualidades e dos gêneros; • A famosa frase de Simone de Beauvoir, ajuda a pensar dessa forma, “não se nasce mulher, torna-se uma”, o que por extensão, também podemos afirmar que não se nasce homem, tão pouco homossexual, heterossexual, bissexual ou qualquer outro atributo que reduza o ser humano a uma identidade fixa e totalizada. • Com isto o sistema sexo/gênero é como se formam as mulheres (estereótipos do que é ser mulher - ser delicada, educada, cuidadora do lar, entre outros) e os homens (macho, que não tem medo de nada, sustenta a família, entre outros); • Rubin (1975) anuncia que o sistema sexo/gênero serve como um dispositivo para controlar e disciplinar as pessoas, cristalizando e normatizando.
• Os Discursos Queer surgiram problematizando e fazendo
críticas as políticas identitárias, pois negam o caráter natural da identidade (antiessencialista) com seu caráter fixo e estabelecido, Deste modo, colocam as pessoas como construções sociais que estão sempre abertas e em constantes transformações; • As identidades são produzidas socialmente, historicamente e geograficamente, no entanto juntamente com a diferença a identidade tende a ser naturalizada, dadas como algo que sempre existiu e que deve continuar;
• A identidade parece ser positivada como “aquilo
que sou”, no entanto traz uma lista extensa de negações, “aquilo que não sou”. • Assim, a noção de identidade pressupõe uma relação de semelhança com determinado modelo que é imposto, seja pela família ou sociedade, assim esquece-se que possa existir as mais variadas diferenciações e se nega os diversos tipos de masculinidades e feminilidades;
• Entendemos que a noção de identidade pressupõe uma
semelhança essencial com algo que é imposto como igual, criando pessoas não pensantes, alienadas até e principalmente em seus desejos, ou seja, uma imposição de como se deve “ser” e “desejar” em sua existência; • Assim, a noção de identidade pressupõe uma relação de semelhança com determinado modelo que é imposto, seja pela família ou sociedade, assim esquece-se que possa existir as mais variadas diferenciações e se nega os diversos tipos de masculinidades e feminilidades;
• Entendemos que a noção de identidade pressupõe uma
semelhança essencial com algo que é imposto como igual, criando pessoas não pensantes, alienadas até e principalmente em seus desejos, ou seja, uma imposição de como se deve “ser” e “desejar” em sua existência; • Ao colocar em xeque as coerências e estabilidades que, no modelo construtivista, fornecem um quadro compreensível e padronizado da sexualidade, o queer revela um olhar mais afiado para os processos sociais normalizadores que criam classificações, que, por sua vez, geram a ilusão de sujeitos estáveis, identidades sociais e comportamentos coerentes e regulares. • Judith Butler (2003) já assinalava que as reificações de gêneros e identidades cristalizam hierarquias e alimentam relações de poder, o que normaliza corpos e práticas, reproduzindo privilégios e exclusões. Essa normalização das identidades – e sua consequente opressão – define padrões de comportamento rejeitando as diferenças. • Daí as identidades serem tomada por Butler como normalizadoras, pois fixam e reificam “papéis sociais”: homem, feminino, masculino, negro, branco etc., perpetuando e reproduzindo subordinações;
• Conquistar direitos pode ser, em parte, ajustar-se à sociedade.
Servir ao exército implica reconhecer que achamos legítima a necessidade de exércitos e implicitamente de guerras; casar pode estar levando a reificar esta forma de relação, no sentido de mostrar que é a única ou a melhor possível para se viver afetos e sexo; adotar filhos e constituir família pode levar a pensar que esses agrupamentos são de maior qualidade do que viver o sexo de modo livre. A proposta política queer não aponta para nenhuma divisão, antes é um apelo unificador à experiência comum de gays, lésbicas, bissexuais, travestis, transexuais e outro(a)s, ou seja, a experiência da vergonha. Ser chamado, leia-se, ser xingado de bicha, gay, sapatão, travesti, anormal ou degenerado(a) é a experiência fundadora da descoberta da homossexualidade ou do que nossa sociedade ainda atribui a ela, o espaço da humilhação e do sofrimento. Transformar esta experiência em força política de resistência é o objetivo da proposta original queer.